06/05/2008

Alfabetizadores voluntários dão lição de superação e auto-estima

Fábio de Castro - Agência Fapesp
Alfabetizadores voluntários dão lição de superação e auto-estima

[Imagem: Agência Fapesp]

Alfabetizadores voluntários

Os alfabetizadores de jovens e adultos que atuam em programas organizados pela sociedade civil, em sua maioria, não são formados para a docência e são provenientes de famílias de baixa escolaridade e de alta vulnerabilidade social.

Um estudo realizado na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) analisou o universo desses alfabetizadores, enfocando como eles adquirem seu conhecimento, como se relacionam com a leitura e a escrita e como superam dificuldades sociais para assumir papel importante na luta contra o analfabetismo.

Prêmio internacional

A tese de doutorado, defendida por Claudia Vóvio no Instituto de Estudos da Linguagem (IEL) da Unicamp, ganhou o prêmio de teses do Centro de Cooperação Regional para a Educação de Adultos na América Latina e Caribe (Crefal). O organismo internacional, com sede no México, foi criado em 1950 por iniciativa da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco).

A pesquisa, intitulada Entre discursos: Sentidos, Práticas e Identidades Leitoras de Alfabetizadores de Jovens e Adultos, foi orientada por Angela Kleiman, coordenadora do Grupo de Pesquisa Letramento do Professor do IEL. Para o trabalho, Claudia contou com apoio da FAPESP por meio de bolsa de doutorado.

Formação de educadores

De acordo com Claudia, o estudo foi feito a partir de sua participação em processos de formação continuada de educadores de pessoas jovens e adultas em programas organizados pela sociedade civil.

"As inquietações que motivaram o estudo eram relativas às necessidades formativas e de profissionalização desses alfabetizadores. A pesquisa investiga e descreve os sentidos, as identidades leitoras, os acervos e as práticas de leitura em que eles estão envolvidos", disse à Agência FAPESP.

Alfabetização de jovens e adultos

Segundo ela, os programas de alfabetização de jovens e adultos criados por iniciativa da sociedade civil - incluindo movimentos sociais, centros comunitários e sindicatos - têm grande relevância, uma vez que o ensino público não tem vagas para absorver toda a demanda potencial por alfabetização. Os dados da última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), de 2006, mostram que o país tinha então 15,5 milhões de analfabetos com mais de 10 anos de idade.

"Esses alfabetizadores não têm uma formação específica para a docência. A problemática central da tese diz respeito ao estudo dos letramentos dessas pessoas, que têm percursos irregulares de escolarização e estão em condição de vulnerabilidade social", destacou.

A pesquisa foi realizada junto a alfabetizadores que atuam em um programa de alfabetização de jovens e adultos de iniciativa não-governamental: o Programa Educar para Mudar, do Conselho Comunitário de Educação e Cultura e Ação Social, uma organização não-governamental localizada em Itaquaquecetuba (SP).

"A organização não-governamental tem uma parceria com o governo federal e recebe verbas para a organização das turmas e pagamento de professores e coordenadores. Os locais são cedidos pela comunidade", explicou Claudia. A região de Itaquaquecetuba, segundo ela, não tem um programa público que ofereça alfabetização para jovens e adultos.

Significações culturais atribuídas à leitura

Os programas de formação continuada oferecidos aos alfabetizadores, de acordo com o estudo, têm papel fundamental. "É a instância na qual eles dão continuidade à sua formação como leitores e que lhes permite dar conta de uma atribuição educativa tão complexa", afirmou.

A pesquisadora utilizou uma metodologia etnográfica, que incluiu dinâmica de rodas de conversas, de práticas de leituras conjuntas, entrevistas, visitas a salas de aula e aplicação de questionários. "Trabalhei dessa maneira junto a nove dos 49 professores da unidade. A metodologia permitiu a geração de dados. Os encontros foram feitos quinzenalmente", explicou.

Claudia procurou descrever como os alfabetizadores tomam posse de significações culturais atribuídas à leitura, à condição de leitor e aos modos de ler, além de investigar os sentidos atribuídos por eles a suas histórias como leitores. Outra questão era saber como se apropriam de objetos culturais relacionados ao universo da escrita a partir da participação em espaços onde se pratica a leitura.

Auto-imagem positiva

Segundo ela, ao contrário dos professores que trabalham em programas formais de alfabetização, os alfabetizadores comunitários, apesar de toda adversidade, constroem uma auto-imagem bastante positiva como leitores.

"Os professores constróem uma imagem bastante autodepreciativa, manifestando uma falta de confiança em sua própria capacidade de cumprir o papel de alfabetizadores. Esses alfabetizadores, por outro lado, se afirmam como leitores e discutem seu papel de uma perspectiva muito positiva, de autolegitimação", afirmou.

Outro fato destacado na tese é que os alfabetizadores do programa, que atua desde 1997 no local, criaram uma rede de intercâmbios sociais altamente dinâmica. "Mesmo com condições de trabalho bastante improvisadas, por falta de espaço, material e apoio, eles conseguem gerar alternativas para dar conta de todo o processo de alfabetização", disse.

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