15/01/2013

Brasil está na contramão da discussão sobre agrotóxicos

Nádia Conceição - UFBA

Maior usuário de agrotóxicos do mundo

Em 1862, a bióloga norte americana Rachel Carson deu o primeiro alerta sobre os efeitos adversos da utilização de pesticidas e inseticidas químicos sintéticos.

A pesquisadora explicava como o DDT - Dicloro-Difenil-Tricloroetano -, por exemplo, penetrava na cadeia alimentar e acumulava-se nos tecidos gordurosos dos animais, inclusive do homem, com o risco de causar câncer e dano genético.

A consequência dessas descobertas foi a proibição nacional da utilização de DDT e outros pesticidas, e o surgimento de grupos ambientalistas nos Estados Unidos.

O Brasil, ao contrário de muitos países da Europa, está na contramão dessa proibição.

O uso de agrotóxicos está regulamentado através da Lei n.º 7.802/89 e do Decreto n.º 4.074, de 2002 e, segundo pesquisa feita pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e pelo Ministério da Saúde, o país se tornou o maior usuário de agrotóxico do mundo.

Tecnologia não saudável

De que maneira um produto químico, que já foi utilizado como arma de destruição de pessoas, pode ser "receitado" pelo governo como um componente para o desenvolvimento da agricultura? No mínimo, os riscos que o seu uso pode trazer para a saúde humana, sobretudo através contaminação dos alimentos, não são levados em conta.

Segundo Ademário Galvão Spínola e Altino Bonfim, da Universidade Federal da Bahia (UFBA), o problema é que a sociedade não toma parte dessa discussão e acaba consumindo produtos contaminados.

"Os agrotóxicos são uma temática que está essencialmente ligada à saúde pública, mas tem uma forte ligação com o agronegócio, onde o país se propõe a exportar mais e acaba usando a tecnologia para aumentar e tornar essa prática mais rentável possível com o uso do agrotóxico", problematizou Spínola.

Ademário também avalia que está em pauta o porquê da permissão, no Brasil, do uso de substâncias que foram banidas em outros países, justamente por haver evidências de que prejudicam a saúde das pessoas, dos animais e dos solos.

"Temos que entender que o agrotóxico é um veneno que mata a praga e mantém a agricultura produtiva, mas ele mata também as vidas pertencentes a esse ambiente no entorno, como as bactérias do solo, os animais e em alguns casos contamina até as águas dos rios".

O Brasil é campeão no uso de agrotóxicos devido à priorização da política de exportação dos estados. "Os nossos governos estão cada dia mais interessados na política de exportação, na perspectiva da reprimarização da economia, baseada nas commodities dos alimentos. Hoje, diante de todos os riscos provocados pelo uso abusivo do agrotóxico, eu, enquanto médico, tenho a preocupação de receitar alimentos saudáveis, reforçando que tem que ser sem agrotóxico", afirmou.

Revolução verde

O surgimento da Revolução Verde - nas décadas de 60 e 70, o qual se baseia na utilização de sementes geneticamente melhoradas e uso de fertilizantes e agrotóxicos para aumentar a produção agrícola, foi fundamental para a expansão, no Brasil, da importação de produtos químicos, da instalação de indústrias produtoras e formuladoras de agrotóxicos.

O governo também seguiu este modelo agrícola e incentivou, através do crédito rural, o uso de agrotóxicos e fertilizantes.

Infelizmente, não é possível contar com os orgânicos para uma produção e consumo livres de pesticidas. Eles são inviáveis devido ao alto custo, e reforçam um quadro de injustiça socioambiental. Os mais pobres pagam o preço. Isto é, além de não terem o direito de escolha, consomem o alimento mais contaminado.

Ademário explica ainda que é falsa a viabilidade dos orgânicos porque outras pesquisas já identificaram impactos do consumo desses alimentos na saúde.

Agroecologia

O pesquisador aponta a Agroecologia como melhor alternativa para o desvencilhamento dessas práticas danosas à saúde.

"Temos que voltar ao tempo dos nossos avós e pais, onde plantávamos nosso alimento em casa, livre de venenos e de transgênicos. Precisamos nos reeducar para sermos menos consumistas e mais próximos da natureza", defende.

"O governo tem que legislar para obrigar o comerciante a identificar nas prateleiras os produtos que usam agrotóxicos e o quanto está presente no produto, pois a olho nu a população não tem como identificar", reivindica o professor, que comenta a existência de um projeto que propõe que o restaurante universitário da UFBA use apenas produtos isentos de agrotóxicos.

O professor destaca, nesse sentido, a importância de se divulgar essas informações na imprensa para que a população tenha o direito de escolha. "Na UFBA, vários professores fazem estudo acerca do uso dos agrotóxicos e nossa intenção é unir esses estudos no próximo ano para unir esforços em tono do esclarecimento dessa temática à sociedade".

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