07/11/2008

Como os cegos sonham?

Liliane Cruz

Sonhos dos cegos

A falta de visão impede que os cegos tenham sonhos? Não. Na ausência dela, os deficientes visuais se valem dos demais sentidos. Sensações, perfumes, sons, barulhos e toques ocupam a mente durante o sono.

Esse é um dos temas de pesquisa da psicóloga Liliane Camargos, que procurou entender como a psicanálise, teoria que se utiliza da interpretação dos sonhos, pode ser aplicada a pessoas com deficiência visual. A pesquisa A psicanálise do olhar: do ver ao perder de vista nos sonhos, na pulsão escópica e na técnica psicanalítica foi defendida como dissertação de mestrado no Programa de Pós-Graduação em Psicologia da UFMG.

Interpretação dos sonhos

De acordo com Liliane, alguns dos conceitos principais da psicanálise foram desenvolvidos a partir do livro A interpretação dos sonhos, de Sigmund Freud. Ela explica que os sonhos analisados pela teoria freudiana se baseavam em dados visuais. Sendo assim, ela se perguntou se os conceitos da psicanálise poderiam ser aplicados a quem não tem visão.

A resposta é positiva, mas Liliane propõe que é necessário levar em conta o olhar do consciente e o olhar das pulsões. Nesse sentido, pacientes cegos podem se submeter a tratamento psicanalítico.

Desejo de ver e ser visto

Na pesquisa, Liliane Camargos também procurou investigar se os cegos têm pulsão escópica. "De forma simplificada, pulsão escópica é um conceito para explicar o desejo das pessoas em ver e serem vistas", explica a pesquisadora. Segundo ela, os entrevistados demonstraram interesse em se vestir bem e combinar roupas, mesmo sem poder ver o que usariam. Na ausência da visão, eles se portam de acordo as premissas da sociedade, que dá muito valor ao visual, diz a pesquisadora.

Cegueira branca

Em um dos capítulos da dissertação, Liliane estabelece contato com a produção literária acerca da cegueira. Um texto analisado é Ensaio sobre a cegueira, de José Saramago, transformado em filme pelo cineasta Fernando Meirelles. A obra de Saramago trata de uma hipotética epidemia de cegueira que assola um país, com o detalhe de que a cegueira é branca e não escura, mais comum.

"Quando eu li o livro, achei estranho uma cegueira branca, mas parece que o Saramago não estava falando de uma cegueira pela ausência, e sim pelo excesso", relata Liliane. Ela afirma que o excesso de estímulos visuais caracteriza a sociedade contemporânea, como se o ser humano não tivesse mais censura ou recalque. Assim como na obra de Saramago, o excesso de luz e de estímulos caracteriza a cegueira coletiva, que resulta no caos.

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