28/09/2021

Contra novas pandemias, precisamos monitorar vírus, fungos e bactérias

Com informações da Agência Fapesp
Contra novas pandemias, precisamos monitorar vírus, fungos e bactérias
Especialistas alertam para os desafios para diagnosticar e combater patógenos emergentes e a necessidade de integrar equipes multidisciplinares e governos para evitar surtos de doenças infecciosas.
[Imagem: Pixabay]

Sistemas de sentinela

A pandemia de covid-19 tornou mais evidente a necessidade de criação de sistemas de sentinela, para monitorar agentes patológicos a fim de evitar surtos ou mesmo prever futuras epidemias.

Além de vírus como o SARS-CoV-2, porém, é fundamental monitorar também fungos e bactérias para os quais ainda não dispomos de tratamentos eficazes.

Esta foi a conclusão de especialistas reunidos durante um evento virtual chamado "Desafios à Saúde Global", promovido pela Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo).

Historicamente, não são apenas vírus que causam pandemias, mas também bactérias. Desde os anos 1960, no entanto, poucos novos antibióticos foram descobertos e hoje há um conjunto de bactérias conhecido pela grande capacidade de escapar aos tratamentos existentes.

"A Organização das Nações Unidas calcula que hoje são 700 mil mortos por ano por conta da resistência aos antibióticos, mas se não fizermos nada, em 2050 serão 10 milhões por ano," afirmou Andrea Dessen, atualmente pesquisadora do Centro Nacional de Pesquisa Científica (CNRS), da França.

A pesquisadora lembrou que são seis as razões apontadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para a resistência aos antibióticos: prescrição excessiva, tratamentos não finalizados, utilização excessiva na pecuária (que consome 80% do volume mundial desses medicamentos), controle insuficiente das infecções em ambientes hospitalares, falta de higiene e saneamento e ausência de antibióticos no mercado.

Monitoramento de vírus

Ester Sabino, professora da Faculdade de Medicina da USP, lembrou a criação de um centro conjunto Brasil-Reino Unido para monitorar novos arbovírus, patógenos transmitidos por artrópodes. A emergência da covid-19, porém, ampliou o escopo do projeto.

O trabalho de sentinela realizado pelo centro abrange até mesmo o monitoramento dos bancos de sangue para verificar a presença de vírus e, no caso dos SARS-CoV-2, das taxas de anticorpos da população e do sequenciamento do vírus isolado de pessoas que procuraram os serviços de saúde.

"Esperávamos uma epidemia de dengue no ano passado e ela não veio. A dengue talvez seja uma doença sensível à mobilidade. Observamos uma queda nos casos quando a mobilidade caiu por conta da [restrição impostas para conter a] covid-19. Mas este ano o mais preocupante é chikungunya, que pode vir quando voltar a movimentação de pessoas. Já houve casos em Santos e outros lugares," disse a pesquisadora.

"Precisamos do SUS [Sistema Único de Saúde], das universidades e do poder público entendendo o que se está falando para poder conseguir definir melhor as políticas. E isso tem de ser feito antes que as epidemias aconteçam para que possamos fazer algo em tempo de melhorar nossa resposta," acrescentou.

Fungos desconhecidos

Por sua vez, o professor Arnaldo Colombo, da Unifesp, destacou que o impacto das infecções fúngicas é uma crise silenciosa na biodiversidade, na segurança alimentar e na saúde humana.

Hoje, esses patógenos ameaçam espécies silvestres como os anfíbios e compõem 30% dos agentes que emergem como patógenos em plantas, inclusive grãos, sendo capaz de comprometer cerca de 20% do que se colhe em diferentes regiões do mundo.

A atividade agrícola é ainda uma causa para a infecção dos trabalhadores do campo, que têm contato com uma fonte de inúmeras espécies de fungos: o solo. Tanto em lesões persistentes de pele como em infecções nos pulmões, os fungos são hoje agentes relevantes para essas doenças, mas muito pouco diagnosticados.

Uma estimativa apresentada pelo pesquisador mostrou que 1,2 milhão de pessoas com pneumonia fúngica são tratados como se tivessem tuberculose.

Paradoxalmente, ainda, avanços na medicina, como unidades de terapia intensiva, tratamentos quimioterápicos e transplantes de órgãos trouxeram também novos fungos causadores de doenças. As micoses oportunistas, como são chamadas, chegam a 1,8 milhão de casos por ano no mundo, com 20% a 70% de mortalidade.

Mesmo assim, os patógenos fúngicos são pouquíssimo conhecidos e até ignorados pelos próprios médicos. Análise realizada em 129 centros médicos na América Latina mostrou que apenas 9% deles apresentavam capacitação para diagnosticar infecções fúngicas.

"É fundamental discutir modelos econômicos que sejam mais compatíveis com a saúde planetária, como o desenvolvimento sustentável. Estamos atrasados em conter o aquecimento do planeta, que tem levado patógenos a se aclimatarem à temperatura de 37 ºC e, com isso, nos infectar," destacou o pesquisador.

"É muito importante termos sistemas de sentinela que permitam que uma pandemia, no início do seu surgimento, seja rapidamente detectada e combatida. Mas tudo isso requer uma interação, uma cooperação, que nem sempre são naturais," destacou Luiz Eugênio Mello, diretor científico da Fapesp.

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