14/04/2008

Nipo-brasileiros têm novos riscos de saúde pela mudança de hábitos

Fábio de Castro - Agência Fapesp

Hábitos de vida ocidentais

Os hábitos de vida do Ocidente podem estar deteriorando a saúde da população nipo-brasileira. Estudo realizado por pesquisadores da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) entre 1993 e 2007, em Bauru (SP), indicou uma alarmante prevalência de diabetes e fatores de risco cardiovascular entre descendentes de japoneses.

No entanto, a fase final do estudo, que consistiu em uma intervenção junto a essa população, demonstrou que algumas mudanças na dieta e a prática de atividades físicas podem ser medidas efetivas para combater o problema.

Prevalência de diabetes

A primeira fase da pesquisa, em 1993, indicou que a prevalência de diabetes entre os descendentes de japoneses era de 20%, em média, contra 7,5% na população brasileira em geral. Em 2000, a segunda fase revelou que o problema havia se agravado: a prevalência de diabetes entre nipo-brasileiros era de 35%.

Os resultados da segunda fase foram publicados na mais recente edição da revista Arquivos Brasileiros de Endocrinologia e Metabologia. A terceira fase foi realizada entre 2005 e 2007.

Predisposição genética

De acordo com a autora principal do artigo, Antonela Siqueira, que atualmente é pesquisadora da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP), os descendentes de japoneses têm uma predisposição genética aos males causados por fatores típicos do cotidiano ocidental, como sedentarismo, estresse e alimentação rica em gordura e açúcar.

"A primeira fase do estudo indicou que a prevalência de diabetes entre os nipo-brasileiros era quase o triplo do resto da população. Em 2000, começamos a estudar a presença da síndrome metabólica - o conjunto de fatores de risco cardiovascular, que inclui diabetes, hipertensão arterial, distúrbios lipídicos e obesidade", disse Antonela à Agência FAPESP.

Miscigenação

Bauru foi escolhida, segundo a pesquisadora, por ter uma comunidade nipo-brasileira ampla e pouco miscigenada, com fácil acesso ao hospital em que foram feitas as análises clínicas. Em 1993, foram avaliados 647 indivíduos de 40 a 79 anos, descendentes de primeira e segunda geração. Em 2000, o estudo foi ampliado para 1.330 indivíduos.

"Em 2000, estudamos também os fatores dietéticos que poderiam contribuir para a prevalência da síndrome metabólica, que, conforme detectamos nessa época, era maior que 5%. O aumento do diabetes nos surpreendeu: passou de 20% para 35% em apenas sete anos", afirmou.

Gordura e glicemia

Embora a população nipo-brasileira não tenha uma obesidade importante, os voluntários apresentaram alta taxa de gordura visceral. "O que importa para essas doenças é a cintura abdominal e não a obesidade periférica. Para os nipo-brasileiros, gordura no abdome significa perigo para a saúde. Os problemas aparecem quando a medida passa de 102 centímetros, para um homem ocidental, ou dos 90 centímetros, para um oriental", apontou.

Os pesquisadores detectaram um aumento de glicemia - ou perda de tolerância à glicose -, que foi associado principalmente ao consumo exagerado de carboidratos refinados, sem fibra, como pão e arroz não-integrais.

"A alta prevalência de síndrome metabólica foi associada a um aumento no consumo de gordura saturada, que aumenta o colesterol ruim. A avaliação longitudinal mostrou que o fator que mais contribuiu para isso foi um consumo exagerado de carne vermelha", disse Antonela.

Tendências preocupantes

O estudo transversal analisou de uma só vez, em uma série de exames, a condição da população de descendentes de japoneses naquele momento e mostrou que todos os indicadores ligados à síndrome metabólica haviam aumentado entre 1993 e 2000.

"Havia aumento do colesterol, do diabetes e principalmente dos triglicérides - associados ao açúcar -, que apareceram aumentados em 66% da população. Enquanto o nível normal é de 150 mg/dL, a média entre os nipo-brasileiros ficou em 240 mg/dL. Alguns indivíduos tinham valores próximos de mil", afirmou.

A prevalência de doença cardiovascular - que pode resultar em infarto, derrame, obstrução arterial periférica e arteriosclerose, atingiu 14% da população analisada. "Se fosse em idosos, essa prevalência não poderia ser considerada muito alta. Mas, para uma população a partir de 30 anos, é altamente preocupante", disse Antonela.

Intervenção necessária

De acordo com Bianca de Almeida Pitito, doutoranda da Unifesp que participou da terceira fase do estudo, a partir dos resultados da pesquisa de 2000 o grupo começou a planejar um programa de intervenção.

"Ao constatar que o diabetes havia aumentado tão drasticamente em sete anos e que havia prevalência da síndrome metabólica, concluímos que, se nada fosse feito, a tendência era que dentro de mais alguns anos os problemas ficassem ainda mais graves. Por isso, planejamos a intervenção", disse Bianca à Agência FAPESP.

Dieta e atividade física

Com uma equipe interdisciplinar, contando com nutricionistas e educadores físicos, os pesquisadores fizeram a intervenção focada em orientação para mudanças na dieta e estímulo à atividade física. O programa não incluiu aplicação de medicação.

Segundo Bianca, o objetivo era comparar as condições de saúde dos voluntários no início e no fim do programa. "Como havíamos detectado o problema, não seria ético deixar parte da população sem acesso ao programa, por isso não houve condições para trabalhar com um grupo de controle", explicou.

Avaliações clínicas

Foram feitas três avaliações clínicas: a primeira no início da intervenção, em 2005, a segunda em 2006 e a terceira no fim do programa, em 2007. "Foram feitos exames para verificar pressão sangüínea, peso, circunferência da cintura, colesterol, triglicerídeo e glicose. Foram avaliados 653 indivíduos", disse.

Depois de um ano de intervenção, segundo Bianca, foi detectada uma melhora sensível em todos os parâmetros: obesidade central, glicemia, perfil lipídico, colesterol, pressão sangüínea e gordura abdominal.

"A redução desses fatores ocorreu apenas com a mudança de dieta e de padrões de atividade física, o que mostra que a mudança de hábitos pode ser fundamental para prevenir a síndrome metabólica", afirmou.

Segundo a pesquisadora a melhora de todos os indicadores em apenas um ano, ainda que não tenha sido drástica, pode ter grande impacto do ponto de vista populacional. Os resultados da análise de 2007 ainda não foram sistematizados.

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