26/06/2009

Diagnóstico molecular permite identificar doença genética rara

Juliana Saragá - Fapemig
Diagnóstico molecular permite identificar doença genética rara
Dos 140 testes já realizados em pacientes com suspeita da doença, 65% possuíam a alfa-tal.[Imagem: Fapemig]

Anemia hereditária

Imagine-se portador de uma doença para a qual não há diagnóstico preciso e cujo tratamento recomendado não surte efeito. Essa era a realidade de centenas de pessoas portadoras da alfa-talassemia ou alfa-tal, um tipo de anemia hereditária caracterizada pela baixa produção de hemoglobina normal.

Seus sintomas se caracterizam por uma anemia discreta, persistente e que não responde a tratamento com suplementação de ferro. Exames laboratoriais não conseguem por si só distinguir a alfa-tal de outras anemias que não apresentam deficiência de ferro.

Essa realidade fez com que pesquisadores da Fundação Hemominas desenvolvessem uma metodologia para diagnosticar com precisão a doença. O projeto Implementação de testes moleculares para diagnóstico da alfa-talassemia e genotipagem de grupos sanguíneos teve início em 2005 e hoje se tornou um serviço pioneiro no estado de Minas Gerais. Coordenado pela geneticista Cibele Velloso Rodrigues, o projeto representa, além de um grande avanço para a saúde, um alívio para os pacientes que esperaram anos por um diagnóstico definitivo da doença.

Alfa-talassemia

A alfa-talassemia é uma anemia hereditária causada pela baixa ou nenhuma síntese de alfa-globina, proteína presente na hemoglobina - substância que permite às células sanguíneas o transporte do oxigênio a todo o sistema circulatório. Dessa forma, o indivíduo portador da alfa-tal apresenta um quadro de anemia, que pode variar entre leve (portador silencioso), moderada e grave. Esta variação vai depender do tipo de mutação genética que leva a uma deficiência ou ausência de alfa globina.

Um indivíduo normal (sem alfa-tal) possui quatro genes alfa, sendo dois herdados do pai e dois da mãe. Durante a formação do feto, a ausência de um destes genes dá origem a um indivíduo chamado portador silencioso, ou seja, apresenta três genes alfa e consegue produzir até 75% de hemoglobina. Essa pessoa não terá nenhum sintoma clínico. "O individuo assintomático pode levar uma vida normal", afirma Cibele Rodrigues.

Quando há perda de dois genes alfa, o indivíduo vai manifestar a doença. "Seus exames laboratoriais indicarão uma anemia branda e, em um primeiro momento, o médico pode pensar que é uma anemia ferropriva (ausência de ferro), iniciando um tratamento de suplementação desta substância. Mas este paciente não vai responder ao tratamento, gerando frustração para o mesmo e demanda persistente nos centros de saúde", comenta a pesquisadora.

Nos casos em que há a destruição de três dos quatro genes alfa disponíveis, o indivíduo vai manifestar o quadro mais grave da doença. Os sintomas são fadiga, fraqueza, pele pálida ou amarelada, urina escura, ossos faciais anormais e baixo crescimento. Devido à dificuldade da hemoglobina em carregar oxigênio para o corpo, pode ocorrer também uma sobrecarga dos órgãos.

Estes pacientes são tratados com transfusões de sangue regular, que pode gerar excesso de ferro no organismo. Neste caso, o excesso deve ser retirado com medicamentos (terapia quelante). Também há casos em que é necessário transplante de medula óssea. Sem tratamento, crianças com alfa-talassemia grave não sobrevivem até depois da primeira infância. Fetos gerados com todos os quatro genes afetados geralmente morrem antes ou logo após o parto (hidropsia fetal).

Alívio para pacientes

É de grande importância para o paciente assintomático saber que é portador da doença, para que possam ser fornecidas as orientações corretas. "Quando um portador silencioso se casa com outro portador silencioso, existe o risco de gerarem filhos com o traço grave da doença, podendo ocorrer até mesmo morte do feto", alerta a bióloga Marina Lobato, também pesquisadora da Hemominas e colaboradora do projeto.

A metodologia desenvolvida pelos pesquisadores do Hemominas trouxe, além do fim da ansiedade para estes pacientes, uma minimização de custos para a saúde pública. Até a criação do teste, o médico poderia desconfiar que seu paciente anêmico era um portador da alfa-tal, caso ele não respondesse ao tratamento com suplementação de ferro, mas não teria como diagnosticar com precisão a doença. Além disto, há um grande perigo no excesso de ingestão do ferro, que em grandes quantidades, se torna uma substância tóxica, causando problemas para o organismo, principalmente para o fígado.

Segundo a pesquisadora, estes casos também sobrecarregam o Sistema Público de Saúde. "Repetindo consultas e exames de hemograma, estes indivíduos estavam sempre atrás de um diagnóstico até então indefinido. A expectativa da equipe é que o teste chegue ao Sistema Único de Saúde (SUS). Estamos em fase de negociação", afirma.

Exame genético

Na Fundação Hemominas já é possível fazer o exame por um preço viável. Uma média de seis testes é realizada por semana. "As pessoas que chegam aqui com uma anemia indefinida e exames laboratoriais suspeitos de alfa-tal são encaminhadas para realizar o teste, que pode ser feito a partir de uma pequena amostra de sangue e concluído em, no máximo, 48 horas", relata André Belisário Rolim, mestrando e colaborador do projeto.

Dos 140 testes já realizados em pacientes com suspeita da doença, 65% possuíam a alfa-tal. A Fundação também possui uma parceria com o Hospital das Clínicas para detectar a alfa-tal em bebês com suspeita da doença, a partir do teste do pezinho.

"O projeto mostra que é possível implantar no Sistema Único de Saúde exames moleculares viáveis e baratos", afirma Marina Lobato. A equipe acredita que, quando o teste for liberado para o SUS e divulgado para a comunidade médica, a demanda será grande. "A Fundação Hemominas já está se preparando, pois sabe que haverá grande demanda", finaliza.

 

Fonte: Diário da Saúde - www.diariodasaude.com.br

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