05/12/2014

Esqueça tudo o que você pensava que sabia sobre genes e mutações

Com informações do Instituto Max Planck

Os genes simplesmente não existem da forma simplista que tem sido apregoada há décadas. E a visão das mutações genéticas ensinada nos livros-texto não é mais adequada.

Estas conclusões que prometem alterar para sempre o campo da genética foram anunciadas na revista Nature por uma equipe internacional liderada por pesquisadores do Instituto Max Planck de Genética Molecular, na Alemanha.

Sequenciamento ambíguo

Em 2001, os cientistas anunciaram a decodificação bem-sucedida do primeiro genoma humano. Desde então, milhares mais foram sequenciados. Enquanto o Projeto Genoma Humano recebeu uma verba de US$53 bilhões, o preço de uma análise genética em breve deverá cair abaixo da marca dos 1.000 dólares.

Dado este ritmo acelerado de desenvolvimento, é fácil esquecer que a tecnologia disponível só lê um produto ambíguo da informação genética. Os métodos analíticos comumente empregados não levam em conta o fato de que cada pessoa tem dois conjuntos de material genético.

"Assim, eles estão ignorando uma propriedade essencial do genoma humano. É importante saber, por exemplo, como as mutações são distribuídas entre os dois conjuntos de cromossomos," alerta a Dra. Margret Hoehe, cuja equipe realizou o estudo que promete mudar para sempre a forma como se vê a genética.

Esqueça tudo o que você pensava que sabia sobre genes e mutações
"Nós precisamos fundamentalmente repensar a visão dos genes que cada aluno vem aprendendo desde a época de Gregor Mendel."
[Imagem: Art 4 Science]

Genes são extraordinariamente individuais

Hoehe e sua equipe desenvolveram métodos de genética molecular e de bioinformática que tornaram possível sequenciar os dois conjuntos de cromossomos de um ser humano separadamente. Os pesquisadores decodificaram as partes materna e paterna do genoma de 14 pessoas e complementaram a análise com o material genético de 372 voluntários do Projeto 1000 Genomas. "Quatorze pessoas pode não parecer muito, mas, dado o desafio técnico, é uma conquista sem precedentes", diz Hoehe.

E apenas neste grupo relativamente pequeno a equipe encontrou milhões de formas diferentes de genes, mostrando que os genes são praticamente individuais. Os resultados mostram também que as mutações genéticas não ocorrem aleatoriamente nos dois conjuntos de cromossomos parentais, sendo distribuídas em uma proporção "mágica" em cada um.

Os resultados mostram que a maioria dos genes pode ocorrer em muitas formas diferentes dentro de uma população: em média, cada gene pode existir em cerca de 250 formas diferentes. Os pesquisadores descobriram cerca de quatro milhões de formas de genes diferentes apenas nos cerca de 400 genomas que eles analisaram. Este valor certamente vai aumentar à medida que mais genomas humanos forem examinados com a nova técnica.

Mais de 85% de todos os genes humanos não têm uma forma predominante, que ocorra em mais de metade de todos os indivíduos. Esta enorme diversidade significa que mais da metade de todos os genes em um indivíduo - cerca de 9.000 em 17.500 - ocorrem exclusivamente em uma pessoa - portanto, são genes individuais no verdadeiro sentido da palavra.

Genes e mutações

O gene, como se imaginava até agora, existe apenas em casos excepcionais. "Nós precisamos fundamentalmente repensar a visão dos genes que cada aluno vem aprendendo desde a época de Gregor Mendel. Além disso, a visão convencional de mutações individuais não é mais adequada. Em vez disso, temos que considerar as duas formas do gene e a combinação de suas variantes," explicou Hoehe.

Ao analisar os genomas, portanto, os cientistas precisarão examinar cada forma parental do gene separadamente, bem como os efeitos de ambas as formas como um par.

Segundo os pesquisadores, as mutações dos genes também não são distribuídas aleatoriamente entre os cromossomos parentais. Eles descobriram que 60% das mutações afetam o mesmo conjunto de cromossomos, e 40% afetam os dois conjuntos. Os cientistas chamam-nas de mutações cis e trans, respectivamente. Evidentemente, um organismo deve ter mais mutações cis, com a segunda forma do gene permanecendo intacta.

Esqueça tudo o que você pensava que sabia sobre genes e mutações
Recentemente, o inventor da edição do DNA alertou que a técnica possui riscos e ainda não está pronta para ser testada em humanos.
[Imagem: MIT Technology Review/Greg Peverill-Conti]

"É incrível como precisamente a relação de 60:40 é mantida. Ela ocorre no genoma de cada indivíduo - quase como uma fórmula mágica," comentou Hoehe. A proporção de 60:40 parece ser essencial para a sobrevivência: "Esta fórmula pode nos ajudar a entender como a variabilidade genética ocorre e como isto afeta a função do gene."

Isto fica ainda mais dramático quando se recorda que, há exatamente um ano, pesquisadores norte-americanos descobriram que as mutações variam no organismo do mesmo indivíduo - uma pessoa pode ter uma mutação em uma parte do corpo e manter o DNA original em outra - e mutações genéticas idênticas ocorrem em pessoas não aparentadas e sem relação umas com as outras. Além disso, já se demonstrou que células geneticamente idênticas comportam-se de formas diferentes.

Genética e doenças

Embora o afã de algumas empresas de conquistar mercados esteja tentando introduzir análises genéticas na saúde pública e até patentear os genes humanos, estes resultados alteram a interpretação das análises genéticas e seu uso para a predição de doenças.

Além disso, se quiser nascer eficaz, a medicina individualizada não poderá ignorar a "natureza dual" dos genomas humanos, diz a pesquisadora.

"Nossas investigações ao nível das proteínas mostraram que 96% de todos os genes têm pelo menos de 5 a 20 diferentes formas de proteína. Isso resulta em uma tremenda diversidade individual em possíveis interações entre genes, e mostra como o desafio de desenvolver terapias individualizadas é intimidante," disse Hoehe.

Até agora, os cientistas e médicos vinham estimando o risco de doenças somente pela presença ou ausência de mutações em determinados genes. No entanto, há evidências de que no câncer, por exemplo, a gravidade e o desenvolvimento da doença são determinados pela distribuição errada de uma mutação. Assim, a localização das mutações tem de ser considerada no diagnóstico, no prognóstico e na prevenção de doenças.

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