Consenso científico
"Há dez anos, não haveria esse consenso, mas as pesquisas a respeito são abundantes e os resultados, claros."
É desta forma contundente que a epidemiologista Irva Hertz-Picciotto, da Universidade da Califórnia em Davis (EUA) se refere aos riscos à saúde da exposição a alguns produtos químicos presentes nos produtos de uso diário.
O consenso mencionado por ela é uma alusão à posição de especialistas de diversas áreas reunidos pelo projeto TENDR (Targeting Environmental Neuro-Developmental Risks, ou "Combatendo Riscos Ambientais ao Neuro-Desenvolvimento"), que reúne cientistas das principais universidades norte-americanas.
Todos concordam que a "exposição contínua a químicos tóxicos presentes no ar, na água, na comida, no solo e nos produtos de consumo podem aumentar o risco de desenvolvimento de problemas cognitivos, sociais ou comportamentais, assim como desordens no desenvolvimento neurológico, como o autismo e a síndrome do déficit de atenção com hiperatividade".
Neurotoxinas
Há pouco mais de dois anos, os cientistas Philippe Grandjean, da Universidade de Harvard, e Philip Landrigan, da Escola de Medicina do Hospital Monte Sinai, publicaram um texto polêmico no periódico The Lancet Neurology que chamou a atenção da imprensa mundial. Nele, defendiam que a humanidade enfrenta uma "pandemia silenciosa" causada por um conjunto de neurotoxinas capazes de prejudicar o desenvolvimento do cérebro.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) também alertou, por meio de vários comunicados, sobre o uso de produtos com estes componentes - ainda que tenha ressaltado que as consequências diretas não são sempre medidas com facilidade e que sua gravidade depende do grau de exposição a eles.
O TENDR é a mais recente voz a se pronunciar contra esses componentes, presentes em alguns alimentos, plásticos e embalagens, cortinas de banheiro, móveis, eletrodomésticos e até certos produtos cosméticos e de higiene diária.
Nesta mesma linha, a Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia concluiu, em um relatório divulgado no ano passado, que o contato contínuo com esses produtos "ameaça a saúde reprodutiva dos humanos".
Veja abaixo algusn dos principais produtos químicos perigosos e o que é possível fazer para evitá-los.
1. Ftalatos
Os ftalatos são um grupo de compostos químicos derivados do ácido ftálico. Os mais empregados são o DEHP (di-2-etilhexilftalato), o DIDP (diisodecilftalato) e o DINP (diisononilftalato). São usados como solventes e na fabricação de plásticos mais flexíveis ou resistentes, como o policloreto de polivinila (PVC), e também servem para fixar essências em produtos químicos.
Graças a essas características, podem ser encontrados em xampus, condicionadores, aerossóis para cabelo, perfumes, esmaltes de unhas, embalagens para comida, cápsulas de medicamentos e brinquedos sexuais.
Vários estudos relacionam esses compostos com uma capacidade intelectual reduzida, a síndrome do déficit de atenção e alterações no sistema hormonal. "Eles entram pela pele ou pelas vias respirátoria ou digestiva e, por meio da circulação, são distribuídos por todo o organismo, passando para as células de tecidos. Alguns têm efeitos tóxicos importantes (não de forma aguda, mas ao longo do tempo), mais concretamente no sistema hormonal", destacam os especialistas.
Diante disso, os Estados Unidos e a União Europeia começaram a regular seu uso e a proibí-lo em brinquedos ou qualquer material com o qual crianças possam entrar em contato.
Apesar das proibições, outros estudos demonstram que a população mundial continua a ser exposta aos ftalatos. Por isso, especialistas recomendam tomar as seguintes medidas para reduzir a possível exposição a estes componentes:
2. Éter de difenila polibromada (PBDE)
Esses compostos são usados para retardar chamas em plásticos ou espumas e são encontrados em muitos equipamentos eletrônicos e, sobretudo, em móveis, porque são aplicados nas espumas de poliuretano contidas neles.
Seu uso se popularizou como um substituto do éter bifenilo policlorado (PCB), proibido no final dos anos 1970. Mas, segundo especialistas, não é uma alternativa muito melhor. Sua degradação na atmosfera é muito lenta, por isso é um composto difícil de ser eliminado. Além disso, se acumula nos animais.
Um estudo da Universidade Colúmbia comprovou que a substância está presente em altas concentrações no leite materno e foi relacionado a uma menor capacidade intelectual e a perda de atenção em mulheres lactantes, o que levou ao banimento do químico no estado da Califórnia. Na Europa, ele só pode ser usado dentro de limites considerados seguros.
Estas são as recomendações de especialistas para minimizar a exposição ao PDBE:
3. Mercúrio
"O mercúrio é uma substância tóxica com efeitos nocivos para o ser humano, em especial para as grávidas, as mulheres lactantes e as crianças", destaca a OMS.
O mercúrio se acumula no solo ou rios, e os microorganismos são capazes de transformá-lo em metilmercúrio (CH3Hg), um composto ainda mais tóxico. "No feto, na lactante e na criança, o principal efeito do metilmercúrio é a alteração no desenvolvimento neurológico (...); afeta negativamente o desenvolvimento do cérebro e do restante do sistema nervoso da criança."
Ainda assim, o mercúrio e seus derivados continuam presentes no cotidiano - considera-se que disseminação das lâmpadas fluorescentes compactas "democratizou" o mercúrio por todo o planeta.
Mas cada pessoa também pode fazer sua parte para evitar a exposição a esse composto tão tóxico, como destaca a Agência para Substâncias Tóxicas e Registro de Enfermidades dos Estados Unidos:
Outros químicos perigosos
Estas substâncias presentes nos produtos de uso diário são apenas algumas entre as que preocupam as autoridades sanitárias. A lista de químicos potencialmente tóxicos é mais longa e inclui também chumbo, flúor, DDT, tetracloroetileno, bisfenol, entre outros.
"Muitos deles são neurotóxicos conhecidos, mas tudo depende do nível de exposição", explica a doutora em toxicologia Laura Plunkett. "Se não estiverem muito presentes na água ou comida ingerida e no ar que respiramos, não terão nenhum efeito."
Na sua opinião, a maioria da população está em contato com eles em níveis muito baixos para que sejam perigosos. No entanto, cuidar-se nunca é demais.
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