09/08/2010

Probióticos são benéficos para portadores de doença intestinal

Isabel Gardenal - Jornal da Unicamp

Probiótica contra diarreia

O uso de probióticos - microrganismos vivos que conferem benefícios à saúde das pessoas quando administrados em quantidades adequadas - nos portadores da Doença de Crohn, uma das principais enfermidades inflamatórias intestinais, mostrou-se eficiente no controle da diarreia, sintoma frequente nestes pacientes.

A conclusão é de uma pesquisa de Luciane Cristina Rosim Sundfeld Giordano e Cláudio Coy, da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp.

Os pesquisadores investigaram os efeitos da modulação da microbiota intestinal dos pacientes pela suplementação oral das bactérias Lactobacillus casei e Bifidobacterium breve. Os achados se mostraram animadores, com os pesquisadores observando redução da ocorrência de diarreia assim como melhora do estado nutricional.

Doença de Crohn

Infelizmente, diz Luciane, a doença de Crohn não é tão rara, lamenta ela, e 424 portadores da doença estão cadastrados e em acompanhamento na Unicamp.

Na pesquisa, a nutricionista identificou que um grande número de pacientes com doença de Crohn apresentava diarreia de difícil resolução. Propôs então o desenvolvimento de um projeto envolvendo o uso de probióticos para avaliar a sua efetividade.

Ela lembra que estes pacientes, na fase de atividade da doença, chegam a apresentar até 25 episódios de evacuações ao dia. "Esta é uma doença crônica que acomete principalmente os indivíduos jovens, podendo atingir todo o trato gastrointestinal, isso com repercussões graves como a desnutrição, por exemplo."

A pesquisadora trabalha na Divisão de Nutrição e Dietética do HC supervisionando a área de preparo de dietas enterais há mais de 15 anos, além de desenvolver seu trabalho nas enfermarias e nos ambulatórios de Gastro bem como membro da equipe multiprofissional de terapia nutricional.

Em meados de 2006, o projeto teve então seu início com o intuito de se verificar a ação de um probiótico especial que continha duas cepas (Lactobacillus e Bifidobacterium) na frequência do hábito intestinal e no estado nutricional. "Dados da literatura demonstraram que 70% a 80% dos pacientes hospitalizados com doença de Crohn ativa possuíam graus variados de desnutrição secundária à diarreia", expõe a pesquisadora. Pelo fato de a doença não ter cura, torna-se portanto fundamental o acompanhamento nutricional, para que a resposta ao tratamento seja mais eficiente."

Inflamação crônica

Luciane selecionou 22 pacientes com idade média de 22 anos por ocasião do diagnóstico. Um dos fatores mais impactantes desta doença, conta, é o fato de seu acometimento ser mais frequente em adultos jovens, numa fase da vida em que eles deveriam estar bastante produtivos. Porém, em função do aparecimento da doença, ocorrem diversas limitações.

Acredita-se que o seu desenvolvimento, a partir do contato com substâncias com potencial de iniciar um processo inflamatório primariamente intestinal, sejam oriundas da alimentação ou de microrganismos presentes no próprio intestino.

"Esta inflamação, que deveria ser de curta duração, torna-se crônica em indivíduos predispostos. Assim, parece lógico supor que a modulação da microbiota intestinal possa alterar diversos aspectos da doença. Este conceito é que orienta inúmeros trabalhos existentes com probióticos na doença de Crohn," recorda Cláudio Coy.

Luciane esclarece que, na doença de Crohn, ocorre um desequilíbrio da microbiota intestinal. Quando o indivíduo está saudável, existe um padrão na população bacteriana e, nos portadores dessa doença, há uma quantidade reduzida sobretudo de Bifidobacterium, mas também de Lactobacillus, bactérias com ações benéficas ao organismo. Isto explicaria porque esta doença manifesta-se predominantemente no final do intestino delgado e cólon (intestino grosso) - segmentos do tubo digestivo com maior quantidade de bactérias.

Tratamento da desnutrição

No estudo, a maioria dos pacientes eram portadores de desnutrição, com perda de peso acima de 10% em seis meses. O probiótico liofilizado (em pó) foi-lhes fornecido durante três meses. Com o seu emprego, observou-se uma recuperação ponderal (de peso) significativa, sem ônus financeiro algum ao paciente. O peso médio aferido no início do estudo foi de 55 kg e, ao final, de 57 kg. Constatou-se melhora também em outros parâmetros nutricionais estudados.

Estes dados evidenciaram que o controle verificado na diminuição do número de evacuações com uso do probiótico trouxe secundariamente um ganho significativo em vários aspectos nutricionais, sem que houvesse interferência nos hábitos alimentares destes pacientes, esclarece a nutricionista.

A incidência das doenças inflamatórias intestinais vem aumentando nos últimos anos em várias partes do mundo, inclusive no Brasil, sem que se conheça ao certo os motivos para tal. O número de casos de doença de Crohn no Ambulatório de Doenças Inflamatórias Intestinais do Gastrocentro, por exemplo, vem crescendo progressivamente.

Em 2003, eram atendidos entre dois e três casos numa manhã, dia desse ambulatório, e atualmente entre 30 e 40 pacientes por período. Cláudio Coy afirma que várias alterações genéticas são atualmente conhecidas e muitas delas relacionadas ao desenvolvimento desta doença. Em algumas famílias e em determinados grupos raciais, há uma incidência maior do que na população geral.

Ao explicar como é a doença, Coy relata que se trata de uma enfermidade crônica e limitante. Além disso, seus portadores lidam com diarreia, cólicas, osteoporose, não se alimentam adequadamente, têm desnutrição, anemia e outras manifestações que transcendem o acometimento intestinal, piorando a qualidade de vida. Muitos pacientes têm que ser operados várias vezes, ficam debilitados e mais predispostos a infecções e complicações pós-operatórias.

Tanto Cláudio Coy como Luciane acreditam que a resposta inflamatória que ocorre no intestino, com envolvimento de outros órgãos, seja desencadeada por alguma alteração na microbiota intestinal e que a sua modulação pode melhorar o curso da doença. A expectativa de ambos é que o emprego de probióticos mostre-se cada vez mais útil, podendo ser instituído como terapia adjuvante ao tratamento medicamentoso.

Probióticos

De acordo com definição da Organização Mundial da Saúde (OMS), em 2002, a mais utilizada internacionalmente, os probióticos são "microrganismos vivos que, quando administrados em quantidades adequadas, conferem benefícios à saúde do hospedeiro". O pioneiro no estudo com probiótico foi o cientista russo Élie Metchnikoff, em 1908, que descobriu o Lactobacilus bulgaricus, a ele cabendo no mesmo ano o Prêmio Nobel de Medicina, por verificar o papel positivo da seleção de bactérias na longevidade do ser humano, o que demonstra que o tema vem sendo investigado há muitos anos.

A partir das suas observações sobre a população de camponeses da Bulgária, sugeriu que as bactérias do leite seriam facilitadoras para a manutenção da saúde e prevenção de doenças, sendo, desta forma, importantes para retardar o envelhecimento. Na época, ele constatou a longevidade dos camponeses búlgaros que, ao saírem para trabalhar, transportavam leite de búfala em moringas de couro. O leite fermentava e eles o ingeriam ao longo do dia. Descobriu-se aí o valor do probiótico, o qual recebeu o nome de Lactobacillus bulgaricus por este motivo.

Neste mesmo período, Henry Tissier, pediatra e microbiologista francês, descobriu que nas crianças em aleitamento materno exclusivo havia a colonização excessiva de um organismo dominante - os quais foram denominados bifidobactérias pelo formato bifurcado - em crianças saudáveis. Observou que as fezes de crianças com diarreia continham baixos níveis deste microrganismo sugerindo que esta bactéria seria administrada a fim de ser restituída a microbiota intestinal saudável destes bebês. Em 1930, no Japão, Minoru Shirota descobriu um probiótico nomeado Lactobacillus casei, cepa Shirota, o qual foi capaz de sobreviver à passagem de todo o trato gastrointestinal, sendo resistentes à acidez e bile, chegando vivos nas fezes.

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