Pensamentos influenciam visão
De acordo com o saber científico atual, categorizar um objeto é uma tarefa do córtex pré-frontal, a região do cérebro responsável pelo raciocínio e outras funções de alto nível que nos tornam inteligentes e sociáveis. Nessa linha de raciocínio, os olhos e as regiões visuais do cérebro são como uma câmera de segurança coletando dados e processando-os de forma padronizada, antes de enviá-los para análise.
No entanto, um novo estudo, idealizado pela neurocientista Nuttida Rungratsameetaweemana, da Universidade de Colúmbia (EUA), mostra que as regiões visuais do cérebro desempenham um papel ativo na compreensão das informações. Fundamentalmente, a maneira como essa parte do cérebro interpreta as informações depende do que o restante do cérebro está fazendo.
Por exemplo, se você estiver no supermercado fazendo compras para fazer uma sopa de inverno e ver batatas, seu cérebro logo pensará em cenouras. Mas, se você estiver pensando em preparar petiscos para assistir o futebol, então seu cérebro imediatamente pensará em um frasco de óleo, para fritar as batatas.
O estudo coletou algumas das evidências mais claras até o momento de que os sistemas sensoriais iniciais da visão desempenham um papel na tomada de decisões - e que se adaptam em tempo real. Os resultados também apontam para novas abordagens para o desenvolvimento de sistemas de inteligência artificial (IA) e visão de máquina que poderão se adaptar a situações novas ou inesperadas.
Veja a seguir uma entrevista com Rungratsameetaweemana, na qual ela dá mais detalhes sobre sua pesquisa.
O que há de interessante neste novo estudo?
Nossas descobertas desafiam a visão tradicional de que as áreas sensoriais iniciais do cérebro estão simplesmente "observando" ou "registrando" informações visuais. Na verdade, o sistema visual do cérebro humano remodela ativamente a forma como representa exatamente o mesmo objeto, dependendo do que você está tentando fazer.
Mesmo em áreas visuais muito próximas da informação bruta que entra nos olhos, o cérebro tem a flexibilidade de ajustar sua interpretação e suas respostas com base na tarefa que você está fazendo. Isso nos dá uma nova maneira de pensar sobre a flexibilidade no cérebro e abre ideias sobre como potencialmente construir sistemas de IA mais adaptativos, modelados com base nessas estratégias neurais.
Como você chegou a essa conclusão?
A maioria dos trabalhos anteriores analisou como as pessoas aprendem categorias ao longo do tempo, mas este estudo se concentrou na questão da flexibilidade: Como o cérebro alterna rapidamente entre diferentes maneiras de organizar a mesma informação visual?
Como foram seus experimentos?
Nós usamos imagens de ressonância magnética funcional para observar a atividade cerebral das pessoas enquanto elas colocavam objetos de diferentes formatos em categorias. A diferença era que as "regras" para categorizar as formas mudavam constantemente. Isso nos permitiu determinar se o córtex visual estava mudando o modo como ele representava as formas, dependendo de como definimos as categorias.
Vimos que o cérebro responde de forma diferente dependendo das categorias em que nossos participantes classificavam as formas.
O que você observou nos dados desses experimentos?
A atividade no sistema visual - incluindo os córtices visuais primário e secundário, que lidam com dados diretamente dos olhos - mudou com praticamente todas as tarefas. Eles reorganizaram suas atividades dependendo das regras de decisão que as pessoas estavam usando, o que foi demonstrado pelos padrões de ativação cerebral se tornando mais distintos quando uma forma estava próxima da área cinzenta entre as categorias. Essas eram as formas mais difíceis de distinguir, então é exatamente quando o processamento extra seria mais útil.
Conseguimos, de fato, ver padrões neurais mais claros nos dados de ressonância nos casos em que as pessoas se saíram melhor nas tarefas. Isso sugere que o córtex visual pode nos ajudar diretamente a resolver tarefas de categorização flexível.
Quais são as implicações dessas descobertas?
A cognição flexível é uma característica da cognição humana, e mesmo os sistemas de IA de última geração ainda enfrentam dificuldades com o desempenho em tarefas flexíveis. Nossos resultados podem contribuir para o desenvolvimento de sistemas de IA que possam se adaptar melhor a novas situações. Os resultados também podem contribuir para a compreensão de como a flexibilidade cognitiva pode se deteriorar em condições como TDAH ou outros transtornos cognitivos. Também é um lembrete de quão notáveis e eficientes nossos cérebros são, mesmo nos estágios iniciais de processamento.
O que vem a seguir para essa linha de pesquisa?
Em um novo estudo de acompanhamento, estamos investigando os mecanismos do circuito da codificação flexível, registrando a atividade neurológica dentro do crânio. Isso nos permite questionar como neurônios e circuitos neuronais individuais no cérebro humano sustentam um comportamento flexível e direcionado a objetivos.
Nós também estamos começando a explorar como essas ideias podem ser úteis para sistemas artificiais. Os humanos são muito bons em se adaptar a novos objetivos, mesmo quando as regras mudam, mas os sistemas de IA atuais frequentemente enfrentam dificuldades com esse tipo de flexibilidade. Esperamos que o que estamos aprendendo com o cérebro humano possa nos ajudar a projetar modelos que se adaptem de forma mais fluida, não apenas a novas entradas, mas também a novos contextos.
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