01/12/2008

Radicais livres são essenciais para os movimentos musculares

Valéria Dias - Agência USP
Radicais livres são essenciais para os movimentos
Os radicais livres, cujo excesso pode levar ao envelhecimento precoce e ao desenvolvimento de doenças do coração, são essenciais ao movimento muscular.
[Imagem: USP]

O lado bom dos radicais livres

As espécies reativas de oxigênio (ERO), muitas vezes designadas como radicais livres, sempre foram vistas como prejudiciais ao organismo humano, por estarem associadas ao envelhecimento precoce e a doenças cardiovasculares e neurodegenerativas.

Entretanto, uma pesquisa apresentada ao Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP comprovou que essas moléculas também exercem um papel importante no organismo durante a contração muscular: elas informam (sinalizam) às células que elas precisam alterar o metabolismo para produzirem mais energia a partir da glicose.

Alterações musculares

"Após uma única sessão de exercício físico/contração, o consumo de energia aumenta. Então o músculo precisa captar mais glicose para transformá-la em energia. Com isso, ocorre uma série de alterações metabólicas no músculo esquelético [músculos ligados aos ossos e que são responsáveis pela locomoção]: aumento na captação de glicose e na expressão gênica do transportador de glicose (GLUT-4). Também há aumento na atividade e expressão gênica de enzimas que metabolizam a glicose, dentre elas a hexoquinase e a fosfofrutoquinase. As ERO produzidas durante a atividade contrátil sinalizam essas respostas metabólicas", aponta o autor do estudo, o fisioterapeuta e fisiologista Carlos Hermano da Justa Pinheiro.

Produção dos radicais livres

De acordo com Pinheiro, os radicais livres são produzidos continuamente pelo músculo esquelético, mesmo em estado de repouso. "Cerca de 97% do oxigênio que chega nas células é usado para queimar glicose (açúcar) e ácidos graxos (gordura) e transformá-los em energia. Os outros 2% a 3% de oxigênio são transformados em radicais livres", conta. O peróxido de hidrogênio e o ânion superóxido são alguns exemplos de ERO produzidas pelo músculo. Ao contrário do superóxido, o peróxido de hidrogênio é uma molécula reativa mais estável e não é um radical livre.

Neutralização dos radicais livres

Os sistemas antioxidantes enzimático e não enzimático neutralizam os efeitos deletérios dos radicais livres no organismo. Uma elevada concentração dessas moléculas nas células caracteriza uma situação chamada de estresse oxidativo (ou desequilíbrio redox). Isso pode ocorrer devido ao aumento da produção de ERO ou a uma queda do potencial antioxidante do tecido.

O fisioterapeuta conta que a maioria dos trabalhos científicos nesta área abordava apenas o papel os radicais livres e do estresse oxidativo no envelhecimento e em doenças neurodegenerativas (como esclerose lateral amiotrófica, Alzheimer e distrofia muscular de Duchenne), diabetes, etc. Ou seja, os pesquisadores sempre se dedicaram a estudar o "lado deletério" dessas moléculas reativas derivadas do oxigênio.

"Porém, iniciou-se o questionamento sobre fato de que as células musculares esqueléticas produzem ERO (espécies reativas de oxigênio) continuamente em repouso e que, durante a atividade contrátil, ocorre um aumento substancial na produção dessas moléculas. Isso os levava a acreditar que as ERO poderiam ter um papel fisiológico. Foi exatamente isso que comprovamos", aponta Pinheiro.

Células musculares esqueléticas

Os ensaios foram realizados por meio de cultura primária de células musculares esqueléticas de ratos. "Sob estimulação, essas células se contraem, reproduzindo a contração muscular. A vantagem de usar este modelo é que a célula fica isolada e não sofre influência de outras células", explica o pesquisador.

Para simular a contração muscular, foi realizada a eletroestimulação das células, por meio de eletrodos de platina. A eletroestimulação induziu contrações de intensidade baixa a moderada. Com uso de sonda fluorescente, o pesquisador verificou que, após a estimulação, havia um aumento na produção de ERO, quando comparado ao grupo controle (que não recebeu estimulação).

Antioxidantes

Em outro experimento, as células foram previamente tratadas com o antioxidante N-acetilcisteína (NAC). Após 24 horas, foi verificado que a cultura de células tratadas com o NAC tinham uma menor quantidade de peróxido de hidrogênio detectado no meio extra-celular após as contrações, em comparação ao grupo controle (que não recebeu NAC).

Nessas células a captação de glicose, atividade de enzimas glicolíticas, produção de lactato e expressão de genes envolvidos na regulação do metabolismo de glicose como GLUT-4, hexoquinase e fosfofrutoquinase foram diminuídas. "Quando as células foram tratadas com peróxido de hidrogênio exógeno em concentração baixa/moderada observamos as mesmas alterações acima citadas. Já, em concentrações elevadas, o mesmo efeito não era observado", conta.

Sinalização redox

Os mecanismos precisos envolvidos nessa sinalização (chamada de sinalização redox) ainda não estão muito claros e necessitam de outras pesquisas.

"Acreditamos que quando em concentração baixa/moderada as ERO causariam oxidações reversíveis em proteínas reguladoras (como enzimas e fatores de transcrição de genes) e modulariam a função celular por alterar transitoriamente a estrutura de moléculas (ativando-as ou inibindo-as) que regulam funções importantes. Já em concentrações elevadas (como no estresse oxidativo) ocorreriam mais oxidações irreversíveis e prejuízos para célula. Talvez o xis da questão em muitas doenças crônicas ligadas ao estresse oxidativo não seja a produção elevada de ERO, mas a diminuição das defesas antioxidantes no tecido o que levaria ao aumento dessas oxidações irreversíveis".

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