Catapora e herpes-zóster
A catapora é uma doença típica da infância que, na maioria dos casos, evolui de forma benigna e os sintomas desaparecem em até 10 dias.
Seu agente causador, contudo, o vírus Varicella zoster, permanece para sempre no organismo. Em alguns casos, pode voltar a incomodar depois de anos, provocando uma nova doença conhecida como herpes-zóster.
Um dos primeiros e mais incômodos sintomas de herpes-zóster é uma dor intensa e incessante conhecida como neuralgia, que afeta principalmente os nervos da região torácica, mas também da região cervical, do nervo trigêmeo (na face) e da lombar. A sensação dolorosa pode vir acompanhada de parestesia (sensações de frio, calor, formigamento ou pressão sem estímulo causador), ardor e coceira. O quadro clínico costuma evoluir para lesões localizadas da pele.
Agora, pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) desvendaram os mecanismos imunológicos desencadeados pelo vírus quando ele é reativado, alterando o funcionamento dos neurônios sensitivos e resultando na neuralgia herpética
TNF
De acordo com os pesquisadores, durante a reativação do vírus, células do sistema imune, particularmente macrófagos e neutrófilos, são atraídas para o tecido nervoso e começam a liberar mediadores inflamatórios (citocinas) na tentativa de eliminar o patógeno.
Uma dessas citocinas inflamatórias, conhecida como TNF (fator de necrose tumoral), se liga a uma proteína (um receptor próprio para TNF) existente na membrana das chamadas células-satélites, que funcionam como auxiliares do neurônio e têm a função de controlar os níveis de potássio no entorno da célula nervosa.
Quando o receptor de TNF é ativado pela citocina, a expressão de uma outra proteína é reduzida: a Kir4.1, que atua como um canal para a passagem de íons de potássio para dentro da célula-satélite.
"Quando o neurônio se despolariza [liberando um impulso nervoso], o potássio sai do meio intracelular para o extracelular. Para manter o equilíbrio químico no local, o excesso de potássio deve entrar na célula-satélite e isso ocorre pelo canal Kir4.1", explicou o professor Thiago Cunha.
Resultados dos experimentos feitos na USP, porém, sugerem que, com a queda na expressão desse canal iônico Kir4.1 induzida pelo TNF, o potássio começa a se acumular em torno do neurônio e isso faz com que a célula nervosa fique com a excitabilidade maior do que deveria.
"O neurônio fica mais sensível a qualquer estímulo e pode até mesmo ocorrer dor espontânea. Não há lesão, portanto, mas uma mudança nas características funcionais da célula," contou Thiago.
Diagnóstico do herpes-zóster
A descoberta, segundo os autores, possibilita a busca de novas terapias que, além de combater a dor aguda, podem impedir que ela se torne crônica - condição conhecida como neuralgia pós-herpética.
"O tratamento para a neuralgia herpética, atualmente, é feito com medicamentos anti-inflamatórios do tipo corticoide. Embora sejam eficazes para eliminar os sintomas, podem prejudicar o controle da infecção, pois são imunossupressores. Resultados de nosso trabalho sugerem que terapias capazes de bloquear a ação de um mediador inflamatório conhecido como TNF poderia agir de forma mais seletiva e eficaz," afirmou Thiago.
Segundo o pesquisador, a maior parte da população mundial é portadora do vírus Varicella zoster, que costuma se alojar nos gânglios nervosos, onde estão localizados os corpos dos neurônios sensitivos que se projetam para as diferentes partes do corpo. Por motivos ainda não totalmente compreendidos - mas que certamente envolvem uma queda na imunidade - ocorre em algumas pessoas a reativação do vírus, causando inflamação no gânglio. O problema é mais comum em pessoas com mais de 60 anos.
"Até que as lesões na pele apareçam, o que costuma demorar entre cinco e 10 dias até que o vírus seja transportado ao longo do nervo, o único sintoma do herpes-zóster é a neuralgia. Isso torna o diagnóstico difícil," comentou Thiago.
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