04/07/2025

O que é consciência? O mistério continua

Erwan Dubois - CNRS

Consciência: uma definição simples, mas uma mensuração complexa

O que é consciência? Quando ela começa? Como pode ser medida? A IA possui ou pode possuir consciência?

Aqui não vamos falar de uma descoberta, mas fazer uma atualização do conhecimento atual sobre esse fenômeno íntimo, universal, porém misterioso, que as neurociências estão apenas começando a decifrar.

De um ponto de vista subjetivo, a consciência parece ser um conceito simples: É o estado em que nos encontramos quando estamos acordados. E, no entanto, sua natureza científica permanece difícil de quantificar. O principal problema está em sua mensurabilidade: Como determinamos se um ser, humano ou não, é consciente?

"Se você me disser que é consciente, eu acredito em você," explica a professora Catherine Tallon-Baudry, do Centro Nacional de Pesquisas Científicas da França (CNRS). "Mas se estou lidando com um organismo que é incapaz de dizer que é consciente, ou com um sistema de inteligência artificial que alega ser, não posso ter tanta certeza."

A consciência é um estado subjetivo. Ela não pode ser observada diretamente, o que é o contrário dos parâmetros biológicos mensuráveis, como níveis de açúcar no sangue ou atividade cardíaca.

Quais seres são conscientes? E como sabemos?

Será que os humanos são os únicos seres conscientes? A questão é objeto de debate na comunidade científica. Não há dúvidas sobre a inteligência de muitas espécies, mas inteligência e consciência não são a mesma coisa.

Alguns primatas, golfinhos e algumas aves demonstram sinais de autoconsciência, no sentido de que parecem se reconhecer em um espelho. Mas a interpretação desse teste permanece problemática. Muitos animais falham, mesmo apresentando comportamentos que sugerem uma forma de consciência.

As neurociências oferecem outra abordagem: O estudo da atividade cerebral associada à consciência. Por exemplo, testes de laboratório podem explorar a "visão no limiar da consciência": Um indivíduo vê breves flashes de imagens para determinar em que ponto elas se tornam conscientemente perceptíveis. Ao analisar como o cérebro processa as informações, os pesquisadores podem estabelecer marcadores cerebrais de consciência. Esses marcadores podem então ser medidos em pacientes em coma, que não se comunicam mais com o mundo exterior, para detectar a presença de qualquer resquício de senciência.

O caso de Vincent Lambert [um paciente em estado de consciência mínima na França, que desencadeou um debate nacional sobre o fim da vida] oferece um bom exemplo das dificuldades em determinar se uma pessoa está consciente quando não consegue se comunicar. Mas e os animais? Protocolos experimentais, frequentemente baseados em recompensas, levantam questões: As respostas dos indivíduos indicam consciência verdadeira ou aprendizado mecânico?

O cérebro é o único árbitro?

A consciência reside exclusivamente no cérebro? "Todo o organismo é consciente, não apenas 1,2 quilogramas de massa encefálica," observa Tallon-Baudry. Ela defende a ideia de que a consciência é o resultado de uma interação complexa entre o cérebro e o corpo - um aspecto frequentemente negligenciado pelas teorias convencionais. Ao longo de vários estudos, a neurocientista demonstrou que as conexões entre o coração e o cérebro permitem prever tanto a autoconsciência quanto a percepção do mundo exterior.

Combinando neurociência e psicologia experimental, o trabalho do professor Nathan Faivre, também do CNRS, reforça essa teoria. Seus estudos demonstraram que perturbações corporais, como alterações na percepção corporal, influenciam significativamente nossa autoconsciência e nossa capacidade de processar informações sensoriais. As descobertas de Faivre indicam que mudanças físicas podem afetar nossa interação com o ambiente e alterar toda a nossa experiência consciente.

Uma teoria universal da consciência: Missão impossível?

A ciência continua a progredir, mas com cautela. Tallon-Baudry coloca a questão assim: "Temos hipóteses, mas é muito cedo para falar de uma teoria". A consciência ainda é um campo de estudo jovem, e o fenômeno em si é extremamente complexo.

Em vez de buscar uma explicação global, a pesquisa atual se concentra em identificar os vários componentes da consciência e os mecanismos biológicos relacionados. O caminho a seguir envolverá desvendar o mistério em uma série de elementos mais acessíveis.

As interpretações filosóficas e religiosas da consciência são consideradas além do escopo da ciência. Tallon-Baudry, que se identifica como materialista, sustenta que a pesquisa deve se limitar ao que pode ser estudado e medido.

A inteligência artificial pode alcançar a consciência?

Ainda assim, algumas questões permanecem: Um sistema de inteligência artificial (IA) poderia um dia atingir o ponto de ser consciente? Se definirmos a consciência somente pela capacidade de processar informações e exercer a razão, alguns sistemas de IA já poderiam ser considerados conscientes. Mas, se a consciência implica necessariamente um aspecto orgânico, subjetivo e emocional, essas máquinas [na realidade são programas de computador] ainda têm um longo caminho a percorrer.

O pesquisador Jean-Rémy Hochmann estuda as origens do desenvolvimento de habilidades humanas únicas, como linguagem e lógica, estudando a cognição em bebês: "Se você perguntar a uma mãe se seu bebê de oito meses está consciente, ela certamente dirá que sim!", comenta ele. "De fato, seu bebê se movimenta, sorri, interage com outras pessoas e até começa a balbuciar. Mas, e uma criança de cinco meses? Três meses? Um recém-nascido com apenas alguns minutos ou horas de vida? Nesses casos, seu comportamento é muito menos controlado, mas nossa pesquisa - assim como o trabalho de Ghislaine Dehaene-Lambertz e Sid Kouider - sugere que as estruturas cognitivas e neuronais básicas que permitem a consciência estão estabelecidas desde muito cedo, talvez desde o nascimento. Ainda assim, mostramos que essas estruturas funcionam mais lentamente em bebês, até seis ou sete vezes mais lentamente aos cinco meses do que em um adulto."

Com a inteligência artificial se tornando cada vez mais poderosa e refinando sua capacidade de raciocínio, o mundo de hoje quase lembra a evolução de Jarvis dos quadrinhos da Marvel, o assistente digital de Tony Stark que se torna Visão, uma entidade autônoma dotada de consciência própria. Ela se transforma de um simples utilitário em um ser capaz de pensar e sentir. É pura ficção científica? Talvez. Mas essa metamorfose levanta uma questão muito real: Será que a inteligência artificial poderá um dia se tornar consciente?

A consciência continua sendo um dos mistérios mais profundos da ciência moderna. Pesquisadores agora tentam desvendar seu funcionamento, explorando-a sob várias perspectivas: Percepção sensorial, autorrepresentação, estados emocionais, etc. É um verdadeiro quebra-cabeça, e cada peça nos aproxima um pouco mais da resposta àquela antiga pergunta: O que nos torna conscientes?

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