De doenças infecciosas para doenças crônicas
Na primeira metade do século passado os brasileiros adoeciam e morriam mais por doenças infecciosas e parasitárias, como malária, sarampo e poliomelite. A partir da década de 1960, essa tendência epidemiológica se inverteu e a maior parte da população começou a padecer de doenças crônicas não transmissíveis.
As conclusões são de uma pesquisa feita no Centro de Pesquisa Aggeu Magalhães (CPqAM), unidade da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) em Pernambuco. O trabalho fez um resgate histórico das mortes em todas as capitais brasileiras de 1950 a 2000, com base em exploração documental e bibliográfica junto ao Ministério da Saúde e ao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Doenças do aparelho circulatório
De acordo com o trabalho, na década de 1930 mais de 45% dos óbitos no Brasil foram causados por doenças infecciosas e parasitárias, enquanto as doenças do aparelho circulatório representaram 10% dos óbitos. Na década de 1980, essa participação caiu para 11% no primeiro grupo de doenças e subiu para 32% no segundo grupo.
“Além do maior acesso da população aos sistemas de saúde e à melhoria na qualidade de vida, a produção de vacinas eficientes atreladas a programas de controle do governo são fatores que explicam a diminuição da mortalidade e morbidade por doenças infecciosas e parasitárias”, disse a coordenadora do trabalho Eduarda Cesse, professora do Departamento de Saúde Coletiva da CPqAM, à Agência FAPESP.
Segundo ela, no topo da lista das doenças crônicas não transmissíveis que mais acometem os brasileiros estão as do aparelho circulatório – como infarto agudo do miocárdio, acidente vascular cerebral e hipertensão arterial –, responsáveis por 27,9% dos óbitos nas capitais brasileiras. Em seguida aparece o câncer (13,7%) e o diabetes (3,8%).
Câncer e diabetes
“De 1950 a 2000 foram registrados nas capitais cerca de 362,9 mil óbitos por doenças do aparelho circulatório, 159,8 mil por neoplasias malignas e 34,3 mil por diabetes. Podemos afirmar que, com base em dados recentes divulgados pelo Ministério da Saúde, as doenças crônicas não transmissíveis são a principal causa de morte entre os pacientes brasileiros”, apontou a sanitarista.
A tendência histórica do estudo feito na Fiocruz indica, por outro lado, uma diminuição no risco de morte por doenças do aparelho circulatório de 1950 a 2000, principalmente nas capitais mais desenvolvidas como São Paulo e Belo Horizonte. Ao mesmo tempo, tanto o risco de óbito como a mortalidade por cânceres e por diabetes sempre estiveram em franco aumento no período analisado.
Tendência de queda
“Em cidades como Recife e Fortaleza, por exemplo, essa tendência de diminuição no risco de doenças do aparelho circulatório ocorreu apenas a partir de 1980, uma vez que esses municípios tiveram um processo de urbanização posterior ao das capitais do Sudeste. Devido à falta de modernização, o risco de contrair esse tipo de doença cresceu entre 1950 e 1980 nessas cidades do Nordeste”, explicou.
O decréscimo no risco de óbitos por doenças do aparelho circulatório nas grandes cidades brasileiras, segundo Eduarda, é uma tendência mundial, mesmo que ainda seja a primeira causa de morte no Brasil. “Na segunda metade do século 20, a prevalência de doenças do aparelho circulatório no Brasil se assemelhou à de países desenvolvidos.”
“Entre algumas explicações para isso estão a melhoria nos diagnósticos e tecnologias médicas, o maior acesso aos serviços de saúde e a maior expectativa de vida da população, cujo envelhecimento tem favorecido o aumento de outras doenças, como o próprio diabetes e cânceres, que ocorrem com mais freqüência depois dos 60 anos de idade”, disse Eduarda.
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