07/03/2022

Escritos de Darwin são a Bíblia da biologia evolutiva

Redação do Diário da Saúde
O professor Detlef Weigel liderou a equipe que descobriu que as mutações genéticas não são aleatórias.
[Imagem: MPG]

Mutações não-aleatórias

Por muitas décadas, os biólogos evolucionistas assumiram que as mudanças no DNA, conhecidas como mutações, ocorrem independentemente de quaisquer consequências para o organismo - em outras palavras, as mutações seriam aleatórias.

Foi então que uma equipe liderada pelo professor Detlef Weigel, do Instituto Max Planck de Biologia, na Alemanha, refutou essa doutrina de longa data em um estudo que atraiu atenção em todo o mundo, ao demonstrar que as mutações no DNA não são aleatórias.

Nesta entrevista, o pesquisador Weigel explica as implicações desta descoberta para nossa compreensão da evolução.

O que há de fundamentalmente novo em suas descobertas?

Detlef Weigel: O que nosso estudo revelou é que as mutações não ocorrem com a mesma frequência em genes importantes e em genes menos vitais - não há distribuição uniforme das mutações - e por que isso acontece.

Agora sabemos que segmentos não genéticos no DNA da Arabidopsis thaliana [planta mais usada em pesquisas científicas] sofrem mutações duas vezes mais frequentemente do que os segmentos genéticos e que a taxa de mutação dos genes menos importantes é quase 50% maior do que a daqueles que são essenciais para a sobrevivência da planta. Isso pode não parecer muito, mas a diferença é realmente enorme.

Essa distribuição assimétrica é o resultado de mudanças químicas no interior do DNA e suas proteínas associadas, que regulam os mecanismos naturais de reparo da célula de tal forma que qualquer dano a segmentos particularmente cruciais do DNA é reparado com mais frequência do que no resto do genoma. É como se esses genes dissessem à célula: "Ei, eu sou muito importante, por favor, tome um cuidado especial comigo!"

Isso explica os chamados genes fósseis, ou seja, genes que quase não mudaram ao longo de milhões de anos e são encontrados em formas muito semelhantes até mesmo nos mais diversos organismos?

Weigel: É pelo menos parte disso. Sabemos há anos que certos segmentos do genoma parecem sofrer mutações com menos frequência do que outros, mas sempre presumimos que não era possível observar muitas das mutações nesses segmentos porque elas eram rapidamente descartadas por processos de seleção natural. Mutações em alguns segmentos são tão nocivas, ou mesmo letais, que os organismos afetados desaparecem rapidamente da população, o que por si só é suficiente para explicar a distribuição observável das mutações.

Mas nós excluímos a seleção natural como única influência em nosso estudo, porque as plantas em nosso laboratório foram cultivadas em condições ideais de crescimento, o que permitiu que todas elas, mesmo aquelas com mutações nocivas, sobrevivessem. Apesar disso, porém, em muitos casos, não ocorreram mutações nos segmentos importantes do DNA.

Outra descoberta recente e importante nesta área é que a edição genética CRISPR-Cas9 pode gerar mutações que passam para os filhos.
[Imagem: MPG]

Quais são as consequências práticas de suas descobertas?

Weigel: Agora sabemos por que é tão difícil alterar certos genes de plantas e, no futuro, pode ser possível anular o mecanismo de proteção contra mutações, o que nos permitiria criar novas culturas com propriedades melhoradas.

Em princípio, pode até mesmo ser possível evitar a mutação de genes humanos envolvidos na etiologia de doenças, o que reduziria o desenvolvimento de câncer e outras doenças baseadas em genes.

Sua pesquisa foi focada na Arabidopsis thaliana, um modelo vegetal popular para estudos de biologia molecular: Este é um caso isolado ou vocês descobriram um fenômeno generalizado?

Weigel: Eu presumo que todos os organismos podem proteger áreas particularmente importantes de seus genomas de mutações. Há alguns anos, vários colegas estudaram a distribuição de mutações em uma bactéria e fizeram descobertas muito semelhantes, mas não conseguiram explicá-las. A maioria dos biólogos evolucionistas duvidou de seus resultados, já que elas pareciam estar completamente em desacordo com a doutrina predominante.

O dogma em questão é que as mutações no genoma são totalmente aleatórias? Isso refuta um dos princípios fundamentais da teoria original da evolução de Darwin?

Weigel: De jeito nenhum. Darwin deixou em aberto a questão da distribuição das mutações e isso nem importa para sua teoria da evolução, nem estamos afirmando que a seleção é supérflua.

A suposição de que as mutações são distribuídas em uma base puramente aleatória foi postulada por gerações de pesquisadores posteriores, os chamados neodarwinistas, principalmente porque ela dá à teoria da evolução uma inclinação particularmente elegante. Portanto, nossas descobertas não mudam como a evolução funciona, apenas a torna mais complexa de lidar.

Darwin estava errado sobre alguma coisa? Certamente havia muita coisa que ele não poderia saber naquela época?

De fato não. Ele era um observador extremamente meticuloso da natureza, que confiava em muita intuição para encontrar as explicações corretas para suas observações. Quase tudo que ele postulou mostrou-se mais tarde correto em princípio, razão pela qual seus escritos se tornaram uma espécie de Bíblia da biologia evolutiva. Um dos resultados potenciais disso é que podemos nem sempre estar fazendo tantas perguntas novas quanto realmente deveríamos.

Checagem com artigo científico:

Artigo: Mutation bias reflects natural selection in Arabidopsis thaliana
Autores: J. Grey Monroe, Thanvi Srikant, Pablo Carbonell-Bejerano, Claude Becker, Mariele Lensink, Moises Exposito-Alonso, Marie Klein, Julia Hildebrandt, Manuela Neumann, Daniel Kliebenstein, Mao-Lun Weng, Eric Imbert, Jon Agren, Matthew T. Rutter, Charles B. Fenster, Detlef Weigel
Publicação: Nature
DOI: 10.1038/s41586-021-04269-6
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