19/09/2024

Não somos tão racionais como acreditamos quando tomamos decisões

Redação do Diário da Saúde
Não somos tão racionais como acreditamos quando tomamos decisões
Há muito sabemos que a racionalidade dos agentes econômicos é um mito.
[Imagem: Gerado por IA]

Somos realmente racionais?

Convencionalmente, a tomada de decisões é retratada como um processo racional: As pessoas calculariam os riscos potenciais e teriam como objetivo maximizar os benefícios que tirarão da decisão.

No entanto, nossos cérebros nem sempre endossam ações racionais, particularmente quando é necessário dar uma resposta imediata. Além disso, é comum que indivíduos escolham erroneamente opções objetivamente piores para si mesmos devido ao modo como essas opções são percebidas em um determinado contexto.

Por exemplo, se um investidor recebe a oportunidade de comprar uma carteira de ações com 60% de probabilidade de gerar lucro, ele provavelmente aceitará. No entanto, se lhe dissermos que há 40% de chance de a carteira gerar-lhe perdas financeiras, ele provavelmente recusará a oferta, ainda que a informação seja exatamente a mesma. Da mesma forma, dois círculos de diâmetro idêntico podem parecer diferentes em tamanho dependendo das formas ao redor deles.

Assim, é o contexto que determina nossa avaliação das opções disponíveis.

Com isto em mente, uma equipe internacional de pesquisadores decidiu investigar se o contexto influencia consistentemente nossas decisões ou se o grau de racionalidade humana varia dependendo de fatores socioeconômicos e culturais, como país de origem, religião, sistema político e outros.

Eles entrevistaram mais de 500 cidadãos da Rússia, França, Argentina, Índia, China e outros onze países, compondo uma amostra notavelmente heterogênea em termos socioeconômicos e culturais.

Maximizar os ganhos

Os voluntários tiveram que realizar uma tarefa de tomada de decisão que consistia em duas fases.

Durante a primeira fase, os participantes deviam escolher entre duas opções, cada uma vinculada à obtenção de uma recompensa ou ao risco de perdê-la. Em cada rodada, as opções foram reiteradas, formando várias combinações para estabelecer contextos nos quais essas opções eram percebidas como mais ou menos gratificantes. Assim, os participantes tiveram a oportunidade de maximizar suas recompensas com base no aprendizado das rodadas anteriores.

O resultado surpreenderia qualquer professor de economia tentando ensinar suas teorias sobre decisões racionais visando a maximização dos ganhos: Todos os participantes, sem exceção, independentemente da nacionalidade, tomaram decisões abaixo do ideal e avaliaram incorretamente as opções em certos contextos.

Para avaliar a reprodutibilidade dos resultados dependentes do contexto da primeira fase do experimento, os pesquisadores instruíram os participantes a realizar uma segunda tarefa, envolvendo uma escolha entre duas opções apresentadas nos mesmos contextos, mas com variáveis conhecidas. Por exemplo, eles disseram aos voluntários que eles poderiam receber uma recompensa substancial com 50% de probabilidade ou optar por uma recompensa garantida, mas pequena.

Ao administrar consistentemente essas loterias, torna-se possível identificar o limite no qual os indivíduos param de correr riscos e escolhem a opção segura.

Propensão ao risco é cultural

Os resultados da segunda rodada reforçaram ainda mais a demonstração de que os seres humanos não são racionais como os cientistas tipicamente acreditam.

O limite quanto a parar de correr riscos é individual e depende da preferência de risco de cada pessoa. E os dados mostraram que esta é uma característica específica da cultura. Assim, os cidadãos russos apresentaram preferências de risco médias, os chineses e japoneses demonstraram a maior propensão ao risco, enquanto os residentes na Índia e no Chile apareceram como os mais avessos ao risco.

"Anteriormente, acreditava-se que o principal fator que influenciava nossas decisões era nossa disposição de correr riscos. No entanto, por meio de nossa pesquisa, descobrimos que nem sempre é esse o caso. Nossa tomada de decisão depende principalmente de como recebemos informações: Se vivenciamos a situação em primeira mão ou se somos informados sobre ela," disse a pesquisadora Oksana Zinchenko, da Universidade Nacional de Pesquisa (Rússia).

"Nós demonstramos que a consciência humana apresenta uma certa limitação cognitiva, que é uma característica compartilhada não contingente às nossas crenças, atitudes ou nacionalidade," acrescentou Zinchenko.

Segundo os autores, as descobertas deste estudo podem encontrar aplicações práticas em economia, psicologia, marketing e até em campos como a filosofia.

Checagem com artigo científico:

Artigo: Comparing experience- and description-based economic preferences across 11 countries
Autores: Hernán Anlló, Sophie Bavard, FatimaEzzahra Benmarrakchi, Darla Bonagura, Fabien Cerrotti, Mirona Cicue, Maelle Gueguen, Eugenio José Guzmán, Dzerassa Kadieva, Maiko Kobayashi, Gafari Lukumon, Marco Sartorio, Jiong Yang, Oksana Zinchenko, Bahador Bahrami, Jaime Silva Concha, Uri Hertz, Anna B. Konova, Jian Li, Cathal O’Madagain, Joaquin Navajas, Gabriel Reyes, Atiye Sarabi-Jamab, Anna Shestakova, Bhasi Sukumaran, Katsumi Watanabe, Stefano Palminteri
Publicação: Nature Human Behaviour
Vol.: 8, pages 1554-1567
DOI: 10.1038/s41562-024-01894-9
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