11/02/2009

Estimulantes injetáveis aumentam risco de hepatite entre atletas

Thiago Romero - Agência Fapesp

Hepatite C entre atletas

Uma alta prevalência de hepatite C entre ex-atletas com histórico de uso de vitaminas injetáveis foi apontada em estudo conduzido por pesquisadores da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (USP) e publicado na revista Memórias do Instituto Oswaldo Cruz.

A relação, de acordo com o trabalho, comprova a hipótese de um novo grupo de risco para a doença, o que pode levar a mudanças na prática médica.

"Trata-se da primeira vez que a relação entre injetáveis lícitos e hepatite C é demonstrada com base na comparação entre grupos expostos e não expostos a esses estimulantes. Estudos anteriores meramente descritivos apenas sugeriam essa associação", disse Afonso Dinis Costa Passos, professor do Departamento de Medicina Social da FMRP e coordenador do estudo, à Agência FAPESP.

Palavras de Sócrates

O grupo analisou 208 ex-atletas profissionais e amadores de futebol e basquete que praticaram essas atividades entre 1960 e 1985 e que responderam a um questionário sobre a exposição a fatores de risco à doença, sobretudo sobre o uso de estimulantes injetáveis.

"Chegamos aos primeiros indivíduos do estudo por indicação do ex-jogador Sócrates, profissional que se formou em nossa universidade e que foi atleta profissional na época de análise do trabalho. E há muito tempo vínhamos recebendo uma parcela significativa de pacientes com hepatite C em nosso ambulatório que não apresentavam nenhum fator de risco conhecido para a doença", disse Passos.

Amostras de sangue dos indivíduos também foram colhidas para detectar a infecção pelo vírus da hepatite C, sendo que os casos positivos foram confirmados por meio do método de reação em cadeia da polimerase (PCR). A prevalência da doença na totalidade dos participantes foi de 7,2%, variando para 5,5% entre os amadores e 11% entre os profissionais.

Grupo de risco para hepatite

Os resultados do levantamento mostraram ainda que o uso de injetáveis era uma prática difundida entre os participantes (24,5%), chegando a 50,8% nos jogadores profissionais. Em ambas as categorias, amadores e profissionais, a presença de infecção foi significativamente maior entre aqueles que admitiram ter usado estimulantes injetáveis no passado.

Dos 63 jogadores profissionais analisados, 32 declararam ter tomado estimulantes há décadas e, desses, 21,9% tiveram diagnóstico de hepatite C após a coleta de sangue. Dos 31 jogadores que não tomaram, nenhum tinha a doença.

"Por sua vez, dos 145 jogadores amadores, 19 ingeriam estimulantes, sendo que 36,8% desses eram positivos. Dos 126 que não tomavam vitaminas injetáveis, apenas um tinha a doença, ou 0,8%. Essas diferenças são muito grandes", disse Passos.

Lícito, mas perigoso

Segundo ele, sempre foi comum associar a hepatite C com o uso de drogas injetáveis ilícitas na prática médica, mas historicamente sua relação com o uso de injetáveis lícitos tem sido negligenciada.

"Os profissionais da saúde que hoje trabalham com o diagnóstico e tratamento de hepatite C sempre tiveram a impressão de que essa associação existia, o que agora estatisticamente, do ponto de vista epidemiológico, é demonstrado pelo presente estudo", afirmou.

Agulhas reutilizadas

De acordo com a pesquisa, entre as substâncias lícitas usadas pelos participantes do trabalho estão a glicose e outros produtos comercializados com os nomes de tiaminose, energizan e glucoenergan, esse último relatado pela maioria dos atletas como o mais frequentemente utilizado.

O glucoenergan foi desenvolvido na década de 1960 como um supressor do apetite e seu uso popular ocorreu entre os atletas a partir desse período. "Essa medicação era administrada no vestiário, antes da prática esportiva, normalmente com seringas e agulhas reutilizáveis, que eram submetidas ao processo de fervura entre as aplicações", disse Passos.

"Mas é preciso deixar claro que não era o glucoenergan ou as outras drogas injetáveis os responsáveis por causar a doença, e sim o modo de aplicação. Na época, as seringas e agulhas não eram descartáveis e o processo de fervura não era capaz de inativar o vírus da hepatite C, que contaminava a agulha e era transmitido entre os indivíduos", explicou o professor, lembrando que as seringas descartáveis só começaram a ser disponibilizadas no Brasil a partir da metade dos anos 1970.

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