26/05/2021

Superfungo prolifera no Brasil na esteira da covid-19

Com informações da Agência Fapesp
Superfungo prolifera no Brasil na esteira da covid-19
Microrganismo pode causar doença invasiva letal e preocupa pela rapidez com que desenvolve resistência aos principais medicamentos usados para combatê-lo.
[Imagem: João Nóbrega Almeida Júnior/Unifesp]

Superfungo

O contexto de caos hospitalar imposto pela pandemia de covid-19 criou no Brasil condições ideais para a emergência da Candida auris, um microrganismo que ganhou o apelido de "superfungo" devido à rapidez com que desenvolve resistência aos principais medicamentos usados em seu combate.

O superfungo foi descoberto no Japão em 2009, mas só despertou a atenção da comunidade científica alguns anos depois, quando surtos de candidemia causados por este agente começaram a aparecer em diversos países asiáticos e europeus. No Brasil, os dois primeiros casos foram confirmados em dezembro de 2020 em um hospital de Salvador (BA).

"Já foram identificados outros nove casos no mesmo hospital, entre colonizados [quando o fungo está no organismo sem causar danos] e infectados. Embora ainda não exista registro desse agente em outros centros no país, há motivos para preocupação: estamos monitorando as características evolutivas de C. auris de pacientes internados naquele hospital baiano e notamos que já há amostras exibindo menor sensibilidade ao fluconazol e às equinocandinas, estas últimas pertencentes à principal classe de fármacos usada no tratamento de candidíase invasiva," contou o Dr. Arnaldo Colombo, da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).

Fungos cândida

Os fungos do gênero Candida (com exceção da C. auris) fazem parte da microbiota intestinal humana e só costumam causar problemas quando há um desequilíbrio no organismo. O mais comum é o surgimento de infecções superficiais na mucosa da vagina (candidíase) ou da boca (sapinho), geralmente associadas à espécie C. albicans.

Em alguns casos, porém, o fungo invade a corrente sanguínea e desencadeia um quadro de infecção sistêmica - conhecido como candidemia - semelhante ao da sepse bacteriana. A invasão da corrente sanguínea e a resposta exagerada do sistema imune ao patógeno podem causar lesões em diversos órgãos e até mesmo levar à morte.

As evidências científicas apontam que, quando a candidemia ocorre em pacientes infectados pela C. auris, até 60% não sobrevivem.

"Essa espécie rapidamente se torna resistente a múltiplos fármacos, sendo pouco sensível a produtos desinfetantes utilizados em centros médicos. Dessa forma, ela consegue persistir no ambiente hospitalar, onde coloniza profissionais de saúde e, posteriormente, pacientes críticos que necessitam de internação prolongada, a exemplo dos portadores de formas graves da covid-19," contou Arnaldo.

Fungos e covid-19

Diversos fatores tornam os pacientes infectados pelo SARS-CoV-2 alvos ideais para a C. auris, entre eles a internação prolongada, o uso de sondas vesicais e cateteres para acesso venoso central (uma porta de entrada para a corrente sanguínea), corticoides (que suprimem a resposta imune) e antibióticos (que desequilibram a microbiota intestinal).

"O próprio vírus pode causar lesões na mucosa do intestino de pacientes com formas graves da covid-19, facilitando o acesso de patógenos à corrente sanguínea, predispondo o paciente à candidemia," afirmou Arnaldo.

O pesquisador destaca que vários países estão relatando a emergência da C. auris no contexto da covid-19 e alerta para a necessidade de intensificar as ações para controle de infecção hospitalar em todo o país, bem como de promover o uso racional de medicamentos antimicrobianos em unidades de terapia intensiva. Desde o início da pandemia, antibióticos como a azitromicina têm sido amplamente prescritos - a grande maioria das vezes sem qualquer necessidade, alerta Arnaldo, o que reforça o desenvolvimento de resistência nos patógenos.

Checagem com artigo científico:

Artigo: Emergence of Candida auris in Brazil in a covid-19 Intensive Care Unit
Autores: João N. de Almeida Jr., Elaine C. Francisco, Ferry Hagen, Igor B. Brandão, Felicidade M. Pereira, Pedro H. Presta Dias, Magda M. de Miranda Costa, Regiane T. de Souza Jordão, Theun de Groot, Arnaldo L. Colombo
Publicação: Journal of Fungi
DOI: 10.3390/jof7030220
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