21/10/2010

Escolas não assumem responsabilidades e culpam família

Glenda Almeida - Agência USP

Crise de sentido

O "discurso pronto" utilizado por diretores de escola e professores ao falarem sobre a relação escola-família e sua influência no aprendizado dos alunos dificulta uma reformulação necessária do modelo de escola no Brasil, que vive uma "crise de sentido".

A constatação é da pesquisadora Márcia Maria Brandão Santos, a partir de entrevistas com professores e diretores de duas escolas da rede pública municipal de uma cidade da região metropolitana de São Paulo.

Márcia Brandão verificou um problema no discurso dos entrevistados que diz respeito ao conceito de família ainda utilizado nas escolas, assim como ao conceito de "participação".

Fugindo da responsabilidade

Segundo a autora, "A escola precisa rever esse discurso, rever essa idealização da família". Essa idealização é problemática porque acaba funcionando como algo sobre o qual a escola deposita uma responsabilidade na família que deveria, na verdade, ser dela.

A pesquisadora propõe que a escola repense seu discurso, e o reconstrua buscando um caminho para que as duas instituições, a família e a escola, dialoguem com o objetivo de criar intervenções funcionais nas práticas para o aprendizado.

Segundo a autora, "É mais fácil dizer que o aluno não aprende por causa da família que enfrenta problemas e deixa a vida dele agitada, do que procurar efetivamente caminhos que façam o aluno aprender apesar das circunstâncias que o cercam, seja quanto a família ou a situação financeira. Não basta aplicar estigmas", afirma.

Relação escola-família

Márcia Maria analisou como as escolas se organizavam, do ponto de vista administrativo e pedagógico.

A pesquisadora identificou nos discursos dos entrevistados alguns importantes fatores que a literatura aponta como determinantes da eficácia escolar, como a capacidade de liderança profissional, relacionamento família-escola, entre outros.

Foi examinado, também, o plano de gestão das instituições e o "discurso modelo" que servia à comunidade docente quando o assunto eram os problemas na trajetória do aprendizado pelo aluno.

Ao decorrer das entrevistas, Márcia percebeu três motivos fluentes sobre os quais os profissionais colocavam a culpa pela "não eficácia" nas escolas: a situação socioeconômica do aluno, o envolvimento do trabalho pedagógico do professor e, o que chamou mais atenção da pesquisadora, a não-participação dos pais, ou seja, as dificuldades na relação escola-família.

Família indispensável

O estudo apontou que, quando perguntados sobre a influência da família no desenvolvimento do aluno, a maioria dos professores já respondia que era realmente essencial.

Porém, ao serem indagados sobre o porquê dessa importância, diziam prontamente que a família era indispensável, pois quando não era "estruturada", a criança apresentava dificuldades na hora de aprender, ou isso acontecia porque os pais não incentivavam e não completavam o trabalho dos professores em casa.

A autora reafirma, ainda, a necessidade de recontextualizar os conceitos de escola no Brasil diante da "crise de sentido" na qual se encontra. "Na atualidade, quando a escola vive o que chamamos de 'crise de sentido', onde os conceitos não são mais os mesmos que antigamente, deve-se olhar a família em seu movimento, vulnerabilidade e fragilidade, bem como suas forças e recursos buscando reconhecê-la como instituição que requer 'cuidado especial' ao ser compreendida. É necessário dar voz aos pais, percebendo o quanto são heterogêneos".

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