Evolução da culinária
Pesquisadores da USP criaram uma teoria matemática que pode ser a chave para explicar a evolução da culinária desde a idade média. O estudo do grupo deu origem ao artigo "A natureza de não-equilíbrio da evolução culinária", que foi destaque na versão online da revista Nature e na versão impressa da New Scientist, ambas britânicas. De acordo com a pesquisa, a culinária evoluiu inspirada na própria evolução genética.
Receitas e ingredientes
Foram estudadas 7.702 receitas e seus 3.394 ingredientes de quatro diferentes livros de culinária: "Dona Benta" (de cozinha brasileira, de três diferentes décadas diferentes - 1946, 1969 e 2004); o "Larousse Gastronomique" (de 2004, de culinária francesa), o "New Penguin Cookery Book" (cozinha inglesa) e o Pleyn Delit (de autoria de duas canadenses que reuniram receitas de vários séculos da idade média e de muitos países da Europa).
O objetivo era verificar com qual freqüência um ingrediente aparece em cada um desses livros e qual a distribuição dessa freqüência dentro de cada culinária. Participaram da pesquisa os professores Antonio Carlos Roque da Silva Filho, Osame Kinouchi e o analista de sistemas Adriano de Jesus Holanda, todos da FFCLRP, além da professora Rosa Wanda Diez Garcia, da FMRP e do físico Pedro Zambianchi.
Após criar e descrever um ranking de freqüência relativa dos ingredientes em cada um desses livros, ou seja, em quantas receitas cada ingrediente apareceu, os pesquisadores descobriram que essa freqüência é muito semelhante em todos os livros. A partir desse resultado o grupo buscou uma teoria que explicasse essa semelhança de freqüência relativa na culinária.
Modelo biológico de evolução
Os pesquisadores simularam no computador a evolução das receitas dentro de um modelo chamado de cópia e mutação, termo já conhecido na biologia. Uma determinada receita gera uma nova com a substituição aleatória, nesse caso, de quatro ingredientes. Isso por várias gerações, como uma mãe, suas filhas, netas, etc. Utilizaram esse processo até chegar ao número de receitas presentes nos livros pesquisados.
Ao analisar o gráfico de distribuição de freqüência dessas "novas receitas", não houve equivalência com o gráfico originário das receitas presentes nos livros. "Percebemos que precisávamos acrescentar na cópia e mutação das receitas o chamado fitness, que pode ser entendido como um elemento que caracterizasse um ingrediente, como sabor, disponibilidade, custo, entre outros", conta Silva Filho.
Fitness
Para determinar o fitness de um ingrediente, os pesquisadores lhe atribuíram, também aleatoriamente, um valor que variou de 0 a 1. Foram substituídos somente os ingredientes cujo fitness do sorteado tivesse valor maior do que o do ingrediente da receita-mãe. Também foi ajustado o tamanho médio das receitas criadas ao tamanho das receitas presentes nos livros.
"Simulamos o que ocorre na mutação genética, só permaneceram os de maior fitness. Com esse modelo, de mutação mais o fitness, o gráfico de distribuição de freqüência das "novas receitas" ficou muito próximo daquele criado a partir das receitas presentes nos livros. Então, concluímos que a culinária evoluiu inspirada na própria evolução genética", diz Silva Filho.
Efeito fundador
Outro fator encontrado pelos pesquisadores que tem relação com a biologia foi o "efeito fundador". Ao elaborar um gráfico de fitness dos ingredientes versus a posição no ranking, os pesquisadores encontraram ingredientes de fitness baixo, mas em ranking alto.
"Chamamos isso de 'efeito fundador', o que ocorre também na genética. São características idiossincráticas de cada culinária. São ingredientes que estavam no início da culinária e mesmo que haja substituição ele acaba permanecendo, pois faz parte da cultura daquele povo, são os elementos fundadores. Em cada cultura existem os seus elementos fundadores. Mesmo não tendo um sabor agradável ou não sendo de fácil acesso."
Novos ingredientes
Por outro lado eles encontraram aqueles ingredientes que mesmo com fitness alto não estão bem no ranking porque são novos na culinária, começaram a fazer parte há pouco tempo e ainda não houve tempo de se tornarem um elemento fundador.
Distribuição de freqüência é uma área da ciência que tem despertado muito interesse, a das redes complexas, e tem revelado que as leis universais não acontecem só na culinária, mas na distribuição de filmes e atores, tamanho de cidades, palavras num texto, etc. "Esse é o ponto de convergência também dos livros de receita, a mesma lei de distribuição", finaliza o professor Silva Filho.
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