26/06/2020

Não, você não vê o mundo objetivamente

Redação do Diário da Saúde
Não, você não vê o mundo objetivamente
Os seus olhos veem uma coisa, mas o seu cérebro lhe diz que você está vendo outra.
[Imagem: JHU]

Subjetividade integral

Você se acha uma pessoa racional, objetiva, que procura ver as coisas de maneira criteriosa e com um certo distanciamento das situações?

Bem, você provavelmente está enganado, afirmam Jorge Morales e uma equipe da Universidade Johns Hopkins (EUA).

Segundo eles, é quase impossível para as pessoas separar a verdadeira identidade de um objeto de sua perspectiva pessoal daquele objeto.

Quando os seres humanos veem as coisas, o cérebro as identifica combinando informações visuais brutas com suposições e conhecimentos sobre o mundo que estão arraigados em sua mente, frutos de toda a sua existência.

Por exemplo, se você pega uma moeda circular e a inclina para longe de você, a luz da moeda atinge seus olhos na forma oval, mas seu cérebro vai além dessa informação e faz você "ver" um círculo no mundo real - ninguém pensa que a moeda se deformou, ainda que agora esteja vendo de fato uma elipse.

Você vê o que quer ver

Os filósofos, desde John Locke e David Hume, se perguntam se é possível separar a maneira como o objeto realmente é (a moeda é um círculo) de como ele chega aos nossos olhos (uma elipse) - em outras palavras, se a visão objetiva pura e uniforme é mesmo possível.

Para tentar achar uma resposta, Morales e seus colegas projetaram um "experimento de filosofia" para ser feito no laboratório.

Ao longo de nove testes, os voluntários viram pares de moedas tridimensionais. Uma era sempre um oval verdadeiro, enquanto a outra era um círculo. Os voluntários tinham que apontar qual delas era verdadeiramente oval.

Parece fácil, mas quando as moedas circulares foram inclinadas, os voluntários ficaram confusos e seu tempo de resposta foi significativamente mais lento. Esse efeito persistiu quer as moedas estivessem paradas ou em movimento, tivessem formas diferentes ou se as moedas fossem mostradas na tela do computador ou diretamente.

A conclusão dos pesquisadores é que a identidade dos objetos está como que "carimbada" no nosso modo de vê-los.

"Nossa abordagem subjetiva do mundo permanece conosco. Mesmo quando tentamos perceber o mundo como ele realmente é, não conseguimos descartar completamente nossa perspectiva," disse Morales.

Curiosamente, o resultado é totalmente compatível com experimentos envolvendo não objetos materiais, mas conceitos e ideias - recentemente outra equipe demonstrou que nos tornamos cegos para informações que contestam nossas crenças.

Filosofia experimental

Este é o primeiro de vários experimentos em que a equipe está trabalhando usando abordagens da psicologia e neurociência para testar ideias da filosofia.

Em colaboração com o filósofo Austin Baker, a equipe está analisando como os estereótipos afetam a percepção - especificamente se as pessoas têm mais dificuldade em ver indivíduos que desafiam seus estereótipos de gênero. Outro projeto examina como as pessoas percebem objetos que não existem, ou como as pessoas percebem a ausência de coisas.

"Este é um projeto que realmente nos surpreendeu - esperávamos que a 'objetividade' superasse totalmente qualquer influência da perspectiva dos voluntários," disse o professor Chaz Firestone. "Este é um bom exemplo de como as ideias da filosofia podem influenciar a ciência da mente e do cérebro."

Checagem com artigo científico:

Artigo: Sustained representation of perspectival shape
Autores: Jorge Morales, Axel Bax, Chaz Firestone
Publicação: Proceedings of the National Academy of Sciences
DOI: 10.1073/pnas.2000715117
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